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STJ. REsp 1527232/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/12/2017, DJe 05/02/2018. Tema repetitivo 950.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.527.232 - SP (2015/0053558-7)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

RECORRENTE : SS INDUSTRIAL SA

RECORRENTE : SS COMÉRCIO DE COSMÉTICOS E PRODUTOS DE HIGIENE PESSOAL LTDA

ADVOGADOS : ELIANE YACHOUH ABRÃO - SP028250

PEDRO PEREIRA DE ALVARENGA NETO E OUTRO(S) - SP275935 RECORRENTE : NATURA COSMÉTICOS S/A

RECORRENTE : INDUSTRIA E COMERCIO DE COSMETICOS NATURA LTDA ADVOGADOS : ANTONIO FERRO RICCI E OUTRO(S) - SP067143

TERESA CELINA DE ARRUDA ALVIM E OUTRO(S) - DF045472 RECORRIDO : OS MESMOS

INTERES. : FREEDOM COSMETICOS LTDA

INTERES. : ABPI - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE"

ADVOGADO : LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA E OUTRO(S) - RJ046214 INTERES. : CONFEDERACAO NACIONAL DA INDUSTRIA - "AMICUS CURIAE" ADVOGADO : CASSIO AUGUSTO MUNIZ BORGES E OUTRO(S) - DF020016A INTERES. : INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL - "AMICUS CURIAE"

ADVOGADO : PROCURADORIA-GERAL FEDERAL - PGF - PR000000F

EMENTA

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCORRÊNCIA DESLEAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. TRADE DRESS. CONJUNTO-IMAGEM. ELEMENTOS DISTINTIVOS. PROTEÇÃO LEGAL CONFERIDA PELA TEORIA DA CONCORRÊNCIA DESLEAL. REGISTRO DE MARCA. TEMA DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL, DE ATRIBUIÇÃO ADMINISTRATIVA DE AUTARQUIA FEDERAL. DETERMINAÇÃO DE ABSTENÇÃO, POR PARTE DO PRÓPRIO TITULAR, DO USO DE SUA MARCA REGISTRADA. CONSECTÁRIO LÓGICO DA INFIRMAÇÃO DA HIGIDEZ DO ATO ADMINISTRATIVO. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA JUSTIÇA FEDERAL.

1.                                         A tese a ser firmada, para efeito do art. 1.036 do CPC/2015 (art. 543-C do CPC/1973), é a seguinte:

As questões acerca do trade dress (conjunto-imagem) dos produtos, concorrência desleal e outras demandas afins, por não envolver registro no INPI e cuidando de ação judicial entre particulares, é inequivocamente de competência da justiça estadual, já que não afeta interesse institucional da autarquia federal. No entanto, compete à Justiça Federal, em ação de nulidade de registro de marca, com a participação do INPI, impor ao titular a abstenção do uso, inclusive no tocante à tutela provisória.

2.                                         No caso concreto, dá-se parcial provimento ao recurso interposto por SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda., remetendo à Quarta Turma do STJ, para prosseguir-se no julgamento do recurso manejado por Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda. e Natura Cosméticos S.A.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso interposto pelas recorrentes SS Industrial

S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Para os fins do art. 1.036, do CPC/2015, foi fixada a seguinte tese repetitiva: "As questões acerca do trade dress (conjunto-imagem) dos produtos, concorrência desleal, e outras demandas afins, por não envolverem registro no INPI, e cuidando de demanda entre particulares, são inequivocamente de competência da justiça estadual, já que não afetam interesse institucional da autarquia federal. No entanto, compete à Justiça Federal, em ação de nulidade de registro de marca, com a participação do INPI, impor ao titular a abstenção do uso, inclusive no tocante à tutela provisória.

Quanto ao recurso interposto pelas recorrentes Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda e Natura Cosméticos S.A., a Seção, por unanimidade, decidiu pela remessa dos autos à Quarta Turma (Juízo Natural), por não haver matéria afetada ao rito dos recursos repetitivos, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Lázaro Guimarães (Desembargador convocado do TRF 5ª Região) e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

Sustentaram oralmente a Dra. Teresa Arruda Alvim, pelas recorrentes Natura Cosméticos S.A. e Outra, e a Advogada da União, Dra. Indira Ernesto Silva, pelo interessado Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI.

Brasília (DF), 13 de dezembro de 2017(Data do Julgamento)

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

Relator

CERTIDÃO DE JULGAMENTO SEGUNDA SEÇÃO

Número Registro: 2015/0053558-7 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.527.232 / SP

Números Origem: 01918615720098260100 1918615720098260100 5830020091918610

PAUTA: 22/11/2017 JULGADO: 22/11/2017

Relator

Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

Presidente da Sessão

Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. MAURÍCIO VIEIRA BRACKS

Secretária

Bela. ANA ELISA DE ALMEIDA KIRJNER

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : SS INDUSTRIAL SA

RECORRENTE : SS COMÉRCIO DE COSMÉTICOS E PRODUTOS DE HIGIENE PESSOAL LTDA

ADVOGADOS : ELIANE YACHOUH ABRÃO - SP028250

PEDRO PEREIRA DE ALVARENGA NETO E OUTRO(S) - SP275935 RECORRENTE : NATURA COSMÉTICOS S/A

RECORRENTE : INDUSTRIA E COMERCIO DE COSMETICOS NATURA LTDA ADVOGADOS : ANTONIO FERRO RICCI E OUTRO(S) - SP067143

TERESA CELINA DE ARRUDA ALVIM E OUTRO(S) - DF045472

RECORRIDO : OS MESMOS

INTERES. : FREEDOM COSMETICOS LTDA

INTERES. : ABPI - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE"

ADVOGADO : LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA E OUTRO(S) - RJ046214 INTERES. : CONFEDERACAO NACIONAL DA INDUSTRIA - "AMICUS CURIAE" ADVOGADO : CASSIO AUGUSTO MUNIZ BORGES E OUTRO(S) - DF020016A

INTERES. : INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL - "AMICUS CURIAE"

ADVOGADO : PROCURADORIA-GERAL FEDERAL - PGF - PR000000F

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas - Propriedade - Propriedade Intelectual / Industrial - Marca

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEGUNDA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

Proclamado adiamento pelo Sr. Ministro Relator, com previsão de julgamento em 13.12.2017.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.527.232 - SP (2015/0053558-7)

RECORRENTE : SS INDUSTRIAL SA

RECORRENTE : SS COMÉRCIO DE COSMÉTICOS E PRODUTOS DE HIGIENE PESSOAL LTDA

ADVOGADOS : ELIANE YACHOUH ABRÃO - SP028250

PEDRO PEREIRA DE ALVARENGA NETO E OUTRO(S) - SP275935 RECORRENTE : NATURA COSMÉTICOS S/A

RECORRENTE : INDUSTRIA E COMERCIO DE COSMETICOS NATURA LTDA ADVOGADOS : ANTONIO FERRO RICCI E OUTRO(S) - SP067143

TERESA CELINA DE ARRUDA ALVIM E OUTRO(S) - DF045472 RECORRIDO : OS MESMOS

INTERES. : FREEDOM COSMETICOS LTDA

INTERES. : ABPI - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE"

ADVOGADO : LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA E OUTRO(S) - RJ046214 INTERES. : CONFEDERACAO NACIONAL DA INDUSTRIA - "AMICUS CURIAE" ADVOGADO : CASSIO AUGUSTO MUNIZ BORGES E OUTRO(S) - DF020016A INTERES. : INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL - "AMICUS

CURIAE"

ADVOGADO : PROCURADORIA-GERAL FEDERAL - PGF - PR000000F

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

1.                                         Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda. e Natura Cosméticos S.A. ajuizaram ação em face de Freedom Cosméticos Ltda., SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda., pretendendo a cessação de alegada prática de concorrência desleal perpetrada pelas rés, assim como a cesssação da violação de suas marcas, identificadoras de suas principais linhas de produtos.

Expõem que a Freedom Cosméticos fabrica os produtos comercializados pelas corrés SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda, sendo a primeira titular da maioria dos processos marcários do Grupo Jequiti, em especial das marcas Jequiti Fresco de Erva Doce e Jequiti Erva Doce +. A SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda., além de ser titular de algumas marcas do Grupo Jequiti (Jequiti Erva Doce mais, Jequiti Oro e Jequiti Revela), comercializa os produtos do grupo, sendo a principal anunciante do website www.jequiti.com.br.

Ponderam que o Grupo Natura tornou-se uma das cem maiores empresas nacionais, líder de mercado no segmento de cosméticos, obtendo o reconhecimento de marca de alto renome, e foram surpreendidas pela utilização indevida de logomarca pelas rés, apresentando, no âmbito do INPI, oposição ao processo de registro das marcas Jequiti Frescor Erva Doce, Jequiti Erva Doce e Jequiti Erva Doce Mais.

Obtemperam que, além da reprodução indevida das marcas requeridas na forma nominativa, as rés vêm se utilizando da identificação de uma linha completa de produtos, em "grafia/roupagem (trade dress) extremamente semelhante àquela aposta" (fl. 9) nos seus produtos.

O Juízo da 31ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial (fls. 1166/1169).

Interpuseram as autoras apelação para o Tribunal de Justiça de São Paulo, que deu parcial provimento ao recurso, por maioria, para o fim de determinar a abstenção das rés de fabricar e comercializar produtos com marcas e embalagens semelhantes às das autoras, sob pena de incidência de multa diária (fls. 1379/1414).

A decisão tem a seguinte ementa:

PROPRIEDADE INDUSTRIAL - Similitude entre os cosméticos produzidos pelas partes - uso das marcas "Jequiti Erva Doce" e "Jequiti Oro" pelas rés constitui comércio parasitário, em usurpação ao prestígio alheio, eis que há notória semelhança ortográfica e fonética com as marcas "Natura Erva Doce" e "Horus", registradas previamente pelas autoras - Inegáveis semelhanças também entre as embalagens dos produtos (trade dress) - Concorrência desleal a ser apreciada por dois ângulos distintos, o da potencialidade de levar o consumidor a erro e do parasitismo e apropriação do prestígio da marca concorrente - Ausência, porém, de danos materiais ou morais indenizáveis - Recurso provido em parte, para o fim de determinar a abstenção das rés de fabricar e comercializar produtos com marcas e embalagens semelhantes às das autoras, sob pena de incidência de multa diária.

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (fls. 1434/1440).

Manejaram as rés SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda. embargos infringentes, que também foram rejeitados, em decisão assim ementada (fls. 1551/1560):

AÇÃO DE ABSTENÇÃO DE ATO ILÍCITO C/C PEDIDO INDENIZATÓRIO E DE LIMINAR DE TUTELA ESPECÍFICA. Uso de marcas semelhantes. Embalagens. Trade Dress. Concorrência desleal. Indenização por perdas e danos. Tutela inibitória. Autoras afirmam que as rés comercializam indevidamente produtos com marcas e embalagens semelhantes às suas. Indução do consumidor a erro. Exploração de prestígio alheio. Parasitismo. Sentença de improcedência. Sentença parcialmente reformada por maioria de votos. Embargos infringentes rejeitados.

Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (fls. 1575/1581). Sobrevieram dois recursos especiais, um deles interposto por Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda. e Natura Cosméticos S.A. e outro por SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda.

No recurso especial interposto por SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda. (fls. 1.658-1.680), com fundamento no artigo 105, inciso III, alínea a, da Constituição Federal, sustentam as recorrentes obscuridade, omissão e violação aos arts. 129, 175, 195 e 209 da Lei n. 9.279/1996; 265, 462 e 535 do CPC/1973.

Afirmam as recorrentes que: a) as autoras ajuizaram, antes mesmo do julgamento dos embargos infringentes, na 13ª vara Federal, da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, autos n. 0114693-71.2013.4.02.5101, ação pleiteando a declaração de nulidade dos registro das marcas Jequiti Frescor de Erva Doce, Jequiti Erva Doce + e Jequiti Oro, de n. 828.655.650, 901.374.911 e 901.405.906; b) "se os registros de marca supracitados garantem o uso havido pelas Recorrentes, por certo, a eventual procedência dos pedidos de abstenção desta demanda somente seria possível com as respectivas declarações de nulidade"; c) suspende-se o processo quando a sentença depender do julgamento de outra causa, ou da declaração da existência ou inexistência da relação jurídica, que constitua o objeto principal de outro processo pendente; d) é inegável que o acórdão proferido no recurso de apelação lhes determinou a abstenção de uso de suas marcas registradas; e) a fundamentação que embasa a decisão recorrida não permite extrair a possibilidade de confusão e/ou desvio de clientela, que são as únicas hipóteses que caracterizariam a violação de trade dress, com base nos arts. 195, III, e 209 da Lei n. 9.279/1996; f) a propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido; g) são proprietárias e legítimas titulares dos registros de marca, devidamente concedidos pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial; h) os registros de marca são válidos e vigentes e, conforme decidido pela Terceira Turma em caso análogo, REsp 1.262.118/SP, relator Ministro Massami Uyeda, o registro de marca confere uso exclusivo em todo o território nacional, sob pena de negativa de vigência ao art. 129 da Lei n. 9.279/1996; i) extrapola a competência da Justiça Estadual a determinação de abstenção de uso de marcas registradas, pois implicaria uma declaração de nulidade, de competência exclusiva da Justiça Federal, conforme precedente do STJ e o disposto no art. 129 da Lei n. 9.279/1996; j) a Corte local reconhece que os elementos de similitude das embalagens objetos da lide são pontuais e que ambas as partes litigantes utilizam a mesma estratégia comercial; k) o desenvolvimento de estratégia comercial, em nenhum sistema econômico do mundo, é considerado exclusivo de quem quer que seja; l) as partes litigantes utilizam equipe própria de consultoras especializadas no segmento de cosméticos, que atendem os consumidores "porta a porta".

Em contrarrazões, afirmam as recorridas Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda. e Natura Cosméticos S.A. que: a) o debate, na instância ordinária, envolveu a violação da marca Hórus das recorridas, em vista do uso da marca Oro pelas recorrentes; b) houve violação ao trade dress do produto Hórus - considerando as embalagens do produto

Oro -, e da marca e logomarca Natura Erva Doce, em vista do uso do sinal Erva Doce como marca dos produtos das recorrentes; c) as embalagens usadas no produto Erva Doce das recorrentes violam o trade dress do produto Natura Erva Doce; d) em nenhum momento, foram analisadas as questões relacionadas a registros de marcas, a despeito destes terem sido concedidos em setembro e outubro de 2011, e o recurso de apelação julgado em março de 2013; e) as recorrentes não impugnaram, nos embargos infrigentes, diversos fundamentos autônomos, especialmente os apurados: risco de associação entre as marcas, os produtos e as embalagens; risco de diluição das marcas registradas e famosas das recorridas; e a prática de atos de concorrência desleal; f) o uso, como marca, do sinal Erva Doce pelas recorrentes viola seus direitos sobre a marca Natura Erva Doce; g) o trade dress do produto Erva doce das recorrentes viola o do produto natura Erva Doce; h) o uso da marca Oro pelas recorrentes viola seus direitos sobre a marca Hórus; i) o trade dress do produto Oro das recorrentes viola o do produto Hórus; j) para infirmar as conclusões obtidas pelos arestos recorridos, seria indispensável o reexame do acervo probatório, obstado no âmbito cognitivo dos recursos excepcionais; k) o risco de confusão e desvio de clientela, consoante os fundamentos dos acórdãos, são substancialmente diferentes daqueles impugnados e mais amplos do que os abordados; l) o art. 209 da Lei n. 9.279/1996 é inaplicável ao deslinde da controvérsia sob a ótica da pretensão recursal das recorrentes, pois versa sobre os requisitos e as circunstâncias aptas a ensejar o dever de indenizar; m) a regra do art. 462 do CPC/1973 dirige-se às instâncias ordinárias; n) a prejudicialidade externa só poderá ter lugar antes de proferida a sentença; o) a existência de registros de marca e demanda no âmbito da Justiça Federal em nada influencia o julgamento da presente causa, pois se busca a abstenção, pelo infrator, do uso indevido de marca; p) na hipótese de existência de prévio registro no INPI, é facultado ao titular da marca violada cumular o pedido de nulidade com o pedido de abstenção do uso da marca específica protegida pelo registro; q) poderá o prejudicado demandar isoladamente as pretensões de nulidade do registro e de abstenção de uso da marca, pois a última é de competência da Justiça Estadual; r) o real objeto da lide é a violação de marca e trade dress, pois "ORO é flagrante imitação da marca registrada HÓRUS, que identifica um dos produtos mais antigos e bem conceituados da linha fabricada e comercializada pelas Recorridas", também para perfumes e colônias; s) a pronúncia da marca registrada das recorridas e pronúncia da marca usada pela recorrente é praticamente idêntica e, também nos aspectos visual e gráfico, há nítida e inequívoca semelhança, aptas a provocar confusão, associação e diluição; t) Erva Doce é parte essencial ou característica da marca, exercendo função marcária, e também houve indisfarçável cópia servil do conjunto-imagem do produto Erva Doce.

No recurso especial interposto por Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda. e Natura Cosméticos S.A. (fls. 1.584-1.618), com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas a e c, da Constituição Federal, sustentam as recorrentes divergência jurisprudencial e violação aos arts. 209 e 210 da Lei n. 9.279/1996; e 884 do CC.

Afirmam as recorrentes que: a) ajuizaram ação vindicando provimento jurisdicional que condenasse as recorridas a reparar os danos patrimoniais e extrapatrimoniais em função da violação de seus direitos de propriedade industrial, e que impusesse a abstenção da prática de atos de concorrência desleal, uso dos sinais Ervas Doce e Oro como marcas de produtos, além de violação do trade dress dos produtos identificados pelas marcas natura Erva Doce e Hórus; b) houve expresso reconhecimento da existência de dolosa violação das marcas natura Erva Doce e Hórus e do trade dress dos produtos; c) o acórdão recorrido reconhece que se tratou de proposital estratégia das recorridas, com vistas a concorrer deslealmente com a líder de mercado, com nítido intuito de provocar a associação indevida e gerar diluição dos sinais distintivos, aproveitando-se de seu bom nome e prestígio; d) há reconhecimento da má-fé e do enriquecimento ilícito, e o art. 209 da Lei n. 9.279/1996 consagra o dever de reparar os danos e prejuízos causados pela violação da propriedade industrial e pela concorrência desleal, que sejam tendentes a abalar a reputação ou os negócios alheios, ou tendentes a criar confusão entre produtos postos no comércio; e) o art. 210 da Lei n. 9.279/1996 determina que os lucros cessantes serão determinados pelo critério mais favorável ao prejudicado, apontando, como critério de reparação, os benefícios auferidos pelo autor da violação; f) o acórdão recorrido reconhece expressamente a violação do direito marcário e a prática de concorrência desleal; g) reconhecendo a ilicitude, a ofensa à capacidade de discernimento do consumidor e que os atos prejudiciais ao desenvolvimento do mercado foram os expedientes encontrados pelas recorridas para crescer no mercado de cosméticos brasileiro, o aresto vergastado sintetiza a indução dos consumidores ao erro, o injusto desvio de mercado, o parasitismo e o proveito do prestígio alheio; h) o dimensionamento, a extensão e a quantificação do dano apenas poderá ser apurado em liquidação de sentença.

Em contrarrazões, afirmam as recorridas SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda. que: a) para negar o pleito indenizatório, a Corte local considerou as provas constantes nos autos, incindindo o óbice imposto pela Súmula 7/STJ ao conhecimento do recurso; b) embora o acórdão recorrido tenha reconhecido a violação de direito de marca, a concorrência de marca e a concorrência desleal, foi expresso ao aduzir que não houve a comprovação dos danos; c) caberia às recorrentes o ônus da prova quanto ao fato constitutivo de direito; d) a comprovação do dano, necessariamente, deveria ser feita na fase instrutória, pois, na liquidação de sentença, não é necessária a exibição de documentos, que nem sequer foram pleiteados como prova antecipada; e) em consonância com o art. 210, I e III, da Lei n. 9.279/1996, as recorrentes deveriam ter juntado documentação apta a demonstrar queda no faturamento dos produtos objeto da lide, ou a juntada de valores recebidos com as outorgas de licenças para que terceiros explorassem as marcas e o trade dress objetos da ação; f) a Corte local apurou não existir provas da possibilidade de confusão, hábil a ensejar o desvio de clientela; g) o art. 209 da LPI não contempla indenizações extrapatrimoniais; h) as recorrentes jamais descreveram os abalos sofridos, "e, conhecedoras da excelente qualidade dos produtos das Recorridas, bem como a alta divulgação publicitária das linhas 'Jequiti', na verdade, lamentam não pertencer a um conglomerado semelhante"; i) não foi demonstrada divergência jurisprudencial.

Os recursos não foram admitidos na origem.

No entanto, dei provimento aos agravos em recurso especial n. 678.760, para determinar a conversão nos presentes recursos especiais, verificando a multiplicidade de recursos a versarem sobre as mesmas controvérsias presentes no recurso especial manejado por SS Industrial S.A e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda.:

a)                                        saber se é possível à justiça estadual impor abstenção de uso de marca registrada pelo INPI;

b)                                        saber se é cabível, em reconhecimento de concorrência desleal, que a justiça estadual determine a abstenção de uso de elementos que não são registrados no INPI, caracterizados pelo "conjunto-imagem" ("trade dress") de produtos e/ou serviços.

Submeti, então, o presente feito à apreciação da egrégia Segunda Seção, na forma do que preceitua o artigo 543-C do CPC/1973. Com isso, facultei a manifestação da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo - CNC, da Confederação Nacional da Indústria - CNI, do Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI e da Associação Brasileira de Propriedade Intelectual - ABPI.

A Confederação Nacional da Indústria - CNI, como amicus curiae, opina no seguinte sentido, in verbis:

I.                             Abstenção de uso de marca

2.                                         A primeira pergunta indaga acerca da possibilidade de imposição, pela Justiça Estadual, de abstenção de uso de marca que já se encontre registrada junto ao INPI - Instituto Nacional da Propriedade Industrial, questão bastante recorrente.

3.                                         Contextualizando a questão, cabe destacar que o problema surge em vista do sistema bifurcado adotado pelo Brasil – assim como por outros países – em relação às lides que envolvam Propriedade Industrial. Assim, se o litígio discutir ato administrativo do INPI (validade do ato, decorrente do pedido de nulidade), deve ser decidido pela Justiça Federal, na forma do art. 109, I, da CF, e do art. 175, da Lei nº 9.279/1996 (Lei da Propriedade Industrial – LPI); caso se examine apenas uma questão concorrencial


(infração da marca ou da patente, com os pedidos de abstenção de uso e/ou indenizatório), a competência será da Justiça Estadual, por se tratar de embate entre duas pessoas jurídicas de direito privado.

I.A.                       Quando apenas o autor tem marca registrada (registro x uso)

4.                                         Revela-se adequado iniciar a análise a partir da hipótese que mais se encontra na prática, consistente na ação em que apenas o autor detém marca registrada e pretende a abstenção de uso por parte do usuário da marca colidente.

Em casos tais, parece indene de dúvidas a competência de Justiça Estadual para determinar a abstenção de uso da marca. Sem o ato administrativo emanado pelo INPI, não há que se falar em competência da Justiça Federal em causa que verse sobre direito de uso de marca. Assim, livre está a Justiça Estadual para julgar a ação de abstenção de uso, conforme sua convicção.

5.                                         Caso, entretanto, o réu levante a questão, como matéria de defesa, sobre a nulidade do registro concedido ao autor, o Juiz Estadual tem sim competência para apreciar a questão, não a fim de anular o registro, mas sim como fundamento de sua decisão, no sentido de definir que, não tendo sido corretamente concedido, o registro do autor não serve para impedir que o réu use sua marca.

I.B.                       Quando ambas as partes têm marca registrada (registro x registro)

[...]

7.        A questão muda, porém, de figura, pois está-se falando de confronto entre duas marcas registradas – o que levaria a Justiça Estadual a impedir o uso de um direito de propriedade com título legitimamente concedido –, e muda mais ainda se o réu, ao se defender, levantar a alegação de nulidade do registro do autor – o que conduziria a Justiça Estadual a ter de decidir sobre a validade de uma marca registrada.

8.        Começando pela questão da cumulação de pedidos perante a Justiça Federal, os dispositivos constitucional e legal retro mencionados (item 2) indicam caso de competência funcional e, portanto, absoluta da Justiça Federal para declarar a nulidade do registro, o que não lhe retira, todavia, a competência para impor a abstenção de uso e a indenização, por ser a nulidade uma questão prejudicial à decisão acerca do direito de uso da marca e do dever de indenizar.

Ensina Cândido Rangel Dinamarco que a relação de prejudicialidade ocorre quando o julgamento de uma causa influi no julgamento de outra: “A primeira diz-se prejudicial à segunda e esta, prejudicada. A prejudicialidade é, em um primeiro momento, uma relação lógica entre duas ou mais demandas: em si mesma, constitui expressão da necessária coerência entre dois julgamentos”. Ou seja, uma vez que do registro decorre o direito de uso da marca (art. 129 da lei 9.279/96), a imposição da abstenção de uso seria um consectário lógico da nulidade e, portanto, também o dever de indenizar pelo período de uso indevido.

[...]

10.                        No caso de as duas marcas em confronto serem registradas, a determinação de abstenção de uso pelo Juízo Estadual geraria a esdrúxula situação de uma das partes – seja ela o autor ou o réu – ser titular de um título de propriedade concedido pelo Estado, título este válido e legítimo, visto que não foi anulado por juiz competente, mas não poder usá-lo devidamente. Assim, a própria lógica do sistema conduz à conclusão que, na hipótese de ambas as marcas terem registro, a ação deve ser decidida pela Justiça Federal, a fim de que seja previamente apreciada a validade de ambos os registros, como questão prejudicial ao pedido de abstenção de uso.

11.                        Já com relação à questão da nulidade como matéria de defesa, quando as duas partes são proprietárias de marca registrada, a declaração de nulidade, ainda que incidentalmente, pela Justiça Estadual, esbarraria em óbice evidente, haja vista a indicação pelo réu de fato impeditivo ao direito do autor, cuja competência para apreciar e julgar não cabe ao Juízo perante o qual a ação foi proposta. Assim, uma vez que o direito de uso da marca pelo réu depende da nulidade do registro concedido ao autor, ao Juízo incompetente para declarar sua invalidade igualmente faltaria competência para impedir o uso da marca. A propósito, fundamentando-se no art. 5º, LIII, da Constituição Federal, Cândido Rangel Dinamarco afirma que “o princípio do juiz constitucionalmente competente vem integrar as garantias do devido processo legal, podendo considerar-se inexistente o processo conduzido pelo juiz desprovido de competência constitucional” .

12.                        Ainda outro raciocínio tem fundamentado as recentes decisões do STJ no sentido de que a competência para declarar a nulidade e, portanto, impor a abstenção de uso de marca já registrada é atribuída pela Lei nº 9.279/96 apenas à Justiça Federal. Este assenta-se na contradição que resultaria de uma interpretação da lei que concebesse “que o reconhecimento incidental da invalidade de registro pudesse ser obtido sem nenhum requisito especial, enquanto essa mesma declaração, pela via principal, conta com regra específica de competência e exige a participação obrigatória do INPI”.

II.                           Abstenção de uso de "conjunto imagem" ("trade dress")

13.                        No que toca à competência da Justiça Estadual para determinar a abstenção de uso de elementos que não são registrados no INPI, caracterizados pelo "conjunto imagem" ("trade dress") de produtos e/ou serviços, a questão é significativamente mais simples. Tendo em vista que esses elementos não são passíveis de registro, sua proteção não envolve ato administrativo, nomeadamente, emanado pelo INPI. Dessa maneira, a abstenção de uso de trade dress não tem como questão prejudicial a nulidade de ato do INPI e nem se submete a regra como a do art. 175 da Lei nº 9.279/96. Portanto, definitivamente é competente a Justiça Estadual para impor tal ordem.

14.                        Quanto à pertinência da ordem de abstenção de uso do conjunto-imagem à vedação à concorrência desleal, cabe, inicialmente, esclarecer que a expressão trade dress tem acepção ampla, consistindo num conjunto de características que incluem, entre diversas outras, “uma cor ou esquema de cores, forma, embalagem, configuração do produto, sinais, frases, disposição, estilização e tamanho de letras, gráficos, desenhos”, sendo capazes de identificar determinado produto e diferenciá-lo dos demais. Não se confunde, entretanto, com a marca registrada, também aposta ao produto.

15.                        Neste contexto, como dito, o conjunto de elementos integrantes do trade dress não é registrável perante o INPI, não havendo, além disso, no ordenamento jurídico brasileiro, expressa proteção ao instituto. Tal papel vem sendo realizado, principalmente, pelas normas de repressão aos atos de concorrência desleal.

16.                        Certo é que a LPI, além de tipificar, no art. 195, uma série de atos como crimes de concorrência desleal, ainda prevê genericamente, no art. 209, a possibilidade de a vítima de quaisquer atos de concorrência desleal, ainda que não previstos em lei, buscar a reparação civil dos danos sofridos. Esta alternativa, consistente na propositura de ação de indenização por perdas e danos, é festejada pela doutrina, merecendo destaque a posição de João da Gama Cerqueira, para quem a norma atinge dois objetivos importantes: [...]

17.                        O que se deseja deixar assente é que, apesar de alguns dos elementos do trade dress serem passíveis de registro, como, por exemplo, a marca e o desenho industrial, o conjunto em si, por não ser expressamente previsto, não pode, ele mesmo, ser registrado. Sua proteção, através do combate à concorrência desleal, depende, portanto, de outros requisitos, reunidos pela doutrina especializada em, primeiramente, a capacidade de o trade dress distinguir o produto ou serviço dos demais e, em segundo lugar, a possibilidade de sua apropriação pelo concorrente gerar, no consumidor, confusão ou associação indevida: “na falta de registro, a imitação ou reprodução do invólucro ou recipiente pode constituir fundamento de ação por concorrência desleal tendente a criar confusão entre os produtos” .

[...]

20.                        Caso ainda não tenha ficado claro, o objetivo no ordenamento, na proteção do conjunto-imagem não é tutelar uma criação intelectual, pois, fosse este o caso, seria ele objeto de registro. Quer-se evitar apenas a confusão por parte dos consumidores ou que um produto, serviço ou estabelecimento seja denegrido.

21.                        Vale lembrar que se está no âmbito do direito empresarial, onde se preza sobejamente a previsibilidade. Previsíveis são os comportamentos quando o agir dos agentes do mercado são governados por regras e, assim, através da regularidade de certos comportamentos, é possível realizar um cálculo sobre o futuro. A reiteração dos comportamentos os dotam de uniformidade, de modo que se tornam razoavelmente previsíveis pelas partes e vai se formando o mercado, o qual é “uma ordem. Ordem no sentido de regularidade e previsibilidade de agir” .

[...]

23.                        A concorrência desleal portanto, descrita pela doutrina como “comportamento imprevisível”, traduzindo-se em atos “contrários à prática e aos costumes usualmente observados nas relações dos agentes econômicos entre si, bem como destes com os consumidores”, merece firme combate, pois viola as expectativas dos agentes econômicos e, consequentemente, causa danos aos negócios entabulados no âmbito de uma comunidade. Esta conclusão, pela promoção da lealdade nas relações de concorrência, implica, entre outras consequências, em que os tribunais cuidem da proteção do conjunto-imagem ou trade dress.

III.                         Conclusão

24.                        Consoante exposto nesta sede, a resposta à primeira pergunta apontada por V. Exa. no presente recurso especial de natureza repetitiva é no sentido da incompetência da Justiça Estadual para impor abstenção de uso de marca, quando esta seja registrada.

25.                        Quanto à questão acerca do cabimento, em reconhecimento de concorrência desleal, de a Justiça Estadual determinar a abstenção de uso de elementos não registrados no INPI, caracterizados pelo conjunto-imagem, a resposta, diante dos fundamentos acima desenvolvidos, é positiva.

A Associação Brasileira de Propriedade Intelectual - ABPI, como amicus curiae, opina no seguinte sentido, in verbis:

Entre os diferentes atos desleais tratados no acordão recorrido há o reconhecimento da violação a “trade dress” (conjunto-imagem) e imitação de marca mista, no tocante a violação da marca “NATURA ERVA DOCE” pela apresentação visual nos produtos da marca mista “JEQUITI ERVA DOCE”.

[...]

9.        Apenas a fim de delimitar corretamente o âmbito da consulta a ser respondida, considera a ABPI que a questão sobre a qual o i. Ministro solicita um posicionamento não se refere a situação mais usual, que ocorre costumeiramente, onde o titular detém o registro de marca junto ao INPI e o suposto infrator não detém qualquer título de propriedade concedido pelo INPI. Nessa hipótese mais comum, dúvida não há que a competência é da Justiça Comum, na medida em que não se questiona a validade de qualquer direito concedido pelo INPI e não atraindo, assim, a competência da Justiça Federal.

[...]

11.                        Nesta específica hipótese, na medida em que ambas as partes detém registros concedidos pelo INPI para suas respectivas marcas em choque, surge a questão da competência da Justiça Estadual para ignorar a existência do registro do réu e impor abstenção do uso de marca registrada no INPI.

12.                        A Lei nº 9.279/96 (“Lei da Propriedade Industrial”) estabelece em seu artigo 129 que o titular de um registro de marca validamente expedido terá assegurado o seu uso exclusivo, em todo o território nacional:

[...]

13.                        Portanto, a Lei da Propriedade Industrial assegura ao titular de uma marca o direito de uso exclusivo do referido sinal distintivo, em todo o território nacional. Além de decorrer da redação literal do artigo 129 da Lei da Propriedade Industrial, o direito de uso de uma marca conferido pelo registro é amplamente reconhecido pela jurisprudência.

14.                        Importa notar que a concessão do registro da marca por ato administrativo exarado pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI, autarquia federal competente para tanto, como todo ato administrativo, é imbuído de presunção de legitimidade e veracidade, de modo que apenas poderá ser contestada após análise de mérito pelo Poder Judiciário.

[...]

16.                        A ação de nulidade do registro de marca está prevista no artigo 173 e seguintes da Lei da Propriedade Industrial, devendo ser proposta no foro da justiça federal e deve contar com a participação do INPI.

[...]

17.                        Importante ressaltar que a Lei da Propriedade Industrial ressalva a possibilidade de o Juiz responsável pela ação de nulidade determinar a suspensão liminar dos efeitos do registro e do uso da marca, caso atendidos os requisitos processuais próprios.

[...]

18.                        A sistemática da Lei da Propriedade Industrial leva à insofismável conclusão que: (i) a concessão do registro da marca, por meio de ato administrativo que goza de presunção de legitimidade e veracidade, confere ao seu titular o direito de uso do referido sinal; (ii) a abstenção do uso da marca apenas seria legitimamente fundamentada por meio de nulidade do próprio registro, e (iii) a nulidade do registro de marca deve ser objeto de ação a ser proposta no foro da justiça federal e deve contar com a participação do INPI, sendo facultado ao Juiz federal suspender liminarmente os efeitos do registro.

19.                        Esse Egrégio Superior Tribunal de Justiça tem precedentes reconhecendo a impossibilidade de um Juiz Estadual, nos autos de uma ação de abstenção de uso indevido de marca, reconhecer incidentalmente a nulidade do registro, sendo necessária a propositura, perante a Justiça Federal, de uma ação de nulidade do referido registro, com a participação do INPI.

[...]

20.                        A ABPI entende que o mesmo raciocínio se aplica para a hipótese de abstenção de uso de marca registrada pelo INPI. Isso porque a ordem de abstenção pressupõe que o Juiz tenha suspendido os efeitos do registro da marca, haja vista que esta confere ao seu titular o direito de uso da marca com exclusividade, e, ato contínuo, tenha determinado a abstenção do uso do sinal distintivo haja vista a existência de uma marca anterior colidente.

21.                        Como a suspensão liminar ou definitiva dos efeitos do registro de marca somente pode ser realizada no âmbito de uma ação de nulidade de marca (artigos 173 e 175 da Lei da Propriedade Industrial) a ABPI entende que não é possível à Justiça Estadual impor a abstenção de uso de marca registrada pelo INPI, mormente porque a ordem de abstenção tem por premissa a suspensão dos efeitos do registro atacado, o que só pode ser realizado no curso de uma ação de nulidade de registro, a ser proposta perante a Justiça Federal.

22.                        Nesse caso, o ofendido deve propor uma ação de nulidade de marca, com pedido de liminar para a imediata suspensão dos efeitos do registro. Na hipótese de a ação de abstenção já ter sido proposta, deve o Juiz Estadual reconhecer a relação de prejudicialidade externa entre as demandas e determinar a suspensão da ação até que haja o julgamento definitivo da ação de nulidade, com fundamento no artigo 313, inciso V, alínea “a” do CPC.

23.                        Tais ponderações são realizadas no plano teórico, sem qualquer análise de mérito com relação à efetiva colidência entre as marcas, à existência de apostilamento com relação a elementos de uso comum das respectivas marcas ou qualquer outro elemento de mérito que poderia justificar a coexistência de duas marcas semelhantes registradas.

[...]

25.                        O trade dress é o conjunto de elementos que compõem a identidade visual de determinado produto ou serviço, distinguindo-o e individualizando-o dos seus congêneres mercado, de maneira a exercer tamanho poder de atração perante o consumidor que pode ser determinante no ato da escolha de determinado produto ou serviços.

26.                        O trade dress configura importante elemento distintivo nos negócios das empresas, podendo caracterizar imensurável vantagem competitiva adotada por determinada sociedade para se sobressair em relação aos concorrentes, o que se nota cada vez mais necessário atualmente.

27.                        No Brasil, a Constituição Federal garante, em seu artigo 5º, XXIX, proteção ao trade dress, sendo este considerado para todos os efeitos legais como um signo distintivo:

XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País;

28.                        Já com relação às normas infraconstitucionais, a proteção ao trade dress decorre da necessidade de repressão aos atos de concorrência desleal, tutelada pela Convenção da União de Paris, a cujo artigo 10 bis o Brasil estendeu sua adesão por meio do Decreto 635/92, a saber:

[...]

29.                        O trade dress é tutelado no Brasil pelo instituto da concorrência desleal, previsto na Lei da Propriedade Industrial por meio do artigo 195, que prevê uma séria de condutas tipificadas como crimes de concorrência desleal.

30.                        Todo e qualquer direito deve cingir-se aos limites impostos pelo seu fim econômico ou social, de modo que, embora seja assegurada ao concorrente a livre disposição de seus meios de produção, deve-se sempre observar a lealdade e lisura no mercado, sendo defesa qualquer modalidade de concorrência desleal e parasitária, cuja repressão está intrinsicamente relacionada à proteção da propriedade industrial, senão confira-se:

[...]

31.                        Sendo assim, o registro do trade dress não é condição indispensável para que se coíba a prática da concorrência desleal. Na realidade, o conjunto-imagem é, por si só, um mecanismo que auxilia no combate à concorrência desleal. Para se verificar a ocorrência desse instituto, fundamental a verificação de elementos que tendem a criar confusão entre os produtos e serviços postos à disposição do consumidor, de modo a fraudulentamente desviar clientela de outro estabelecimento.

[...]

32.                        Dessa forma, diferentemente do que acontece com o registro de marca, a proteção à concorrência desleal e, consequentemente, ao trade dress independe de qualquer registro perante o INPI, tratando-se de discussão travada apenas entre particulares.

Consequentemente, o Juiz Estadual tem competência irrestrita para julgar ação de abstenção que tenha por objeto a violação de trade dress.

[...]

33.                        Na prática, supondo um produto cuja marca registrada viole marca de terceiro, bem como o trade dress do produto viole o trade dress do mesmo terceiro, pode o Juiz Estadual determinar que o Réu se abstenha de violar o trade dress do terceiro, mas não pode determinar a abstenção do uso da marca enquanto os efeitos do registro não forem suspensos por um Juiz Federal, nos autos de uma ação de nulidade de marca.

O Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI , como amicus curiae, opina no seguinte sentido, in verbis:

A questão tratada no RESP nº 1527232/SP assume caráter deveras importante para o INPI, de sorte que se afigura inarredável uma manifestação substancial da Autarquia, mormente por força da submissão do recurso ao sistema de julgamento de demandas repetitivas.

O Recurso Especial afetado como representativo da controvérsia traz, em essência, 2 temas que, muito embora estejam relacionados, merecem tratamentos distintos pelo INPI.

[...]

Sem embargo, depara-se com um caso em que marcas concedidas regularmente pelo INPI (registros nºs 828655650; 901374911 e 901405906) restaram expressamente invalidadas por órgão da Justiça Estadual, em descompasso com o que dispõe o art. 175 da Lei 9.279/96. Não se pode olvidar, ademais, que, tratando-se de ato praticado por Autarquia Federal, a competência para revisão da concessão efetuada pelo INPI é da Justiça Federal, nos termos do art. 109, I da CRFB/88.

Com efeito, cuida observar como restou ementado o acórdão do Eg. TJ/SP, por ocasião do julgamento da apelação das autoras:

[...]

Fica muita evidente, destarte, que, para além da violação ao sistema de propriedade industrial inserido pela Lei 9279/96, a decisão objeto do RESP em referência representa burla ao próprio sistema de competência judicial delineado pela CRFB/88, notadamente por ofender a previsão de competência descrita no art. 109, I da Carta Magna.

Outrossim, oportuno apontar que as mesmas autoras da ação nº 583.00.2009.191861-0, que tramitou perante o Juízo da 31ª Vara Cível de São Paulo/SP, e originou o RESP em tela, também ajuizaram ação de nulidade de marca na Justiça Federal do Rio de Janeiro com o fito de invalidar os atos concessórios das mesmas marcas ora examinadas.

Trata-se da ação de nulidade nº 01l4693-71.2013.4.02.5101, em trâmite perante o Juízo da 13ª Vara Federal do Rio de Janeiro, na qual o INPI também integra o pólo passivo, como, aliás, não poderia deixar de ser, nos moldes do art. 175 da LPI c/c art. 109, I da CRFB/88. Relevante informar que o Juízo da 13ª VF/RJ proferiu sentença de improcedência do pedido, mantendo incólumes os atos praticados pelo INPI.

Ainda que a sentença proferida no processo acima referido esteja no Eg. TRF-2ª Região para exame do recurso de apelação das autoras, fato é que, atualmente, têm-se 2 decisões conflitantes a respeito das mesmas marcas: o acórdão do Eg. TJIRJ que determina a abstenção do uso, o que é objeto do RESP em apreço; e a sentença da 13ª Vara Federal do Rio de Janeiro que, de forma diversa, manteve a validade das marcas.

Ora, à luz do sistema de repartição de competência jurisdicional estabelecido pela Constituição de 1988, não há espaço para sobreposição de competência desta natureza, justamente porque muito clara a definição do que seja atribuição da Justiça Federal e, por sua vez, daquilo que concerne à Justiça Estadual, o que só faz sobressair a transgressão constitucional constatada na espécie.

[...]

Nesta toada, forçoso reconhecer que a controvérsia travada no RESP em comento, conquanto seja de especial importância para o INPI pela inequívoca ofensa ao art. 175 da LPI e art. 109, I da CRFB/88, não traz em seu bojo questão jurídica que represente novidade em sede jurisprudencial, justamente porque, em hipóteses análogas, o Colendo STJ tem sido uníssono em afirmar a competência da Justiça Federal, tal como pontuou o Parquet.

Basta conferir, neste sentido, os acórdãos prolatados nos RESPs 1.189.022/SP; 1.188.105/RJ; 1.281.448/SP e no AgRg no RESP 254.141/SP para se concluir que o Colendo STJ vem reconhecendo a incompetência da Justiça Estadual para, nos autos de ação de abstenção de uso indevido de marca, julgar inválido o registro efetuado pelo INPI, afirmando, outrossim, a competência da Justiça Federal por força da necessária participação da Autarquia Federal.

A solução a ser empregada no RESP sub examine, portanto, parece de lege lata, não se imaginando outro desfecho além da reafirmação da competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, I da CRFB/88, ao menos no que tange à parte em que determinação para abstenção do uso de marca concedida regularmente pelo INPI. Contudo, o que realmente vem sendo objeto de preocupação sistemática, por parte do INPI, é a recorrência de decisões de órgãos da Justiça Estadual que, em ações de abstenção de uso, impõem alguma forma de mitigação ao direito decorrente do registro marcário, em geral relativizando o atributo da exclusividade previsto no art. 129 da Lei 9.279/96.

A mitigação dos atributos inerentes ao registro marcário, estabelecida por órgãos da Justiça Estadual, consubstancia, a rigor, questão de direito hábil a despertar a incidência da norma prevista no art. 1.036 do NCPC. Até porque, em casos tais, diversamente do que se observa no RESP em tela, a invalidação do registro efetuado pelo INPI se faz de forma velada e não explícita, induzindo um abalo imperceptível, mas importante no sistema.

[...]

Não é demais lembrar que, enquanto signatário de diversos Acordos Internacionais a respeito de propriedade industrial, o Estado Brasileiro se comprometeu a resguardar os direitos daí decorrentes, sendo certa, portanto, a absoluta necessidade de respeito e prestígio ao sistema de propriedade industrial engendrado pela Lei 9.279/96.

Afinal, as formas de proteção à propriedade industrial previstas na Lei 9.279/96 estão essencialmente de acordo com a CUP - Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial e com o acordo TRIPS (Trade Related Aspects of Intelectual Property Rights - Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio), os dois mais importantes Acordos Internacionais em matéria de propriedade industrial.

Assim é que, para além de se conferir respeito ao princípio da legalidade, manter hígido o sistema de propriedade industrial delineado pela Lei 9.279/96 consubstancia, em essência, o adimplemento de um compromisso internacional firmado pelo Brasil, revelando-se nocivo ao interesse nacional eventual transgressão ao referido sistema.

Resta, agora, apurar se decisões da Justiça Estadual que impõem alguma forma de mitigação no uso de marca registrada pelo INPI causam algum abalo no sistema de propriedade industrial brasileiro, e em que medida.

Dentre as formas de proteção da propriedade industrial viabilizadas pela Lei 9.279/96, interessa à presente análise aquela prevista no seu art. 2°, III, qual seja, a concessão de registro de marca.

[...]

Ocorre, todavia, que, não raro, o INPI é surpreendido com relato de titulares de marcas registradas a respeito de decisões judiciais proferidas por órgãos da Justiça Estadual que procedem, mesmo que veladamente, à revisão do ato concessório, daí porque especialmente profícua a oportunidade ora franqueada à Autarquia de se manifestar sobre esta questão.

De fato, na maioria dos casos que chega à Justiça Estadual, a controvérsia gira em torno da colidência entre uma marca registrada junto ao INPI e um nome comercial ou mesmo título de estabelecimento, todos sinais distintivos igualmente tutelados pelo art. 5°, XXIX da CRFB/88, sendo a marca amparada pela Lei 9.279/96 e os demais signos distintivos abrigados pelo Código Civil.

Em essência, o que importa para o INPI, enquanto responsável pela execução das normas do sistema de propriedade industrial, são as ações cujo desfecho seja uma determinação que acarrete, de algum modo, a mitigação do uso da marca regularmente registrada, porque, neste caso, o próprio sistema de propriedade industrial restaria abalado.

Neste passo, curial asseverar que não se verifica qualquer problema em órgãos da Justiça Estadual procederem à análise de questões ligadas à propriedade industrial, ao revés, o INPI é entusiasta da disseminação do sistema, até para que ele se consolide, e, com isso, o Brasil se apresente como um ambiente seguro de negócios, alavancando os investimentos necessários ao seu esperado desenvolvimento.

Faz-se deveras alvissareira a assimilação de que a Lei 9.279/96 estabeleceu um marco importante de inserção do Brasil, de forma definitiva, no cenário do comércio mundial, contribuindo sobremaneira para o incremento de sua credibilidade ao instituir ferramentas de proteção da propriedade industrial, com o que propiciou a segurança necessária aos investimentos projetados no país e, em última análise, impulsiona seu próprio desenvolvimento.

Logo, não se discute a possibilidade de que disputas em torno da propriedade industrial sejam encetadas perante órgãos da Justiça Estadual, desde que respeitado o sistema instituído pela Lei 9279/96. Nesta senda, revela-se, no mínimo, inconveniente decisão judicial que, de algum modo, mitigue o direito decorrente do registro marcário, mormente quando tal ocorre de forma discrepante dos preceitos estabelecidos na Lei 9279/96. Desguarnecer a exclusividade inerente ao registro significa, à evidência, desnaturar o próprio direito daí advindo, porquanto esvaziado o seu principal atributo, de acordo com o art. 129 da LPI.

É o sistema de propriedade industrial, afinal, que resta fragilizado com decisões deste quilate, o que em nada contribui para a consolidação de um ambiente favorável de negócios, condição sine qua non para os investimentos de que tanto necessita o Brasil.

Há, com efeito, decisões da Justiça Estadual que simplesmente esvaziam o atributo da exclusividade inerente ao registro marcário, perpassando pelo próprio exame efetuado pelo INPI. A propósito, existem diversos precedentes em Tribunais Locais, valendo conferir, por todos, o seguinte julgado do Eg. TJ/SP:

[...]

Insta observar no julgado que, em verdade, procedeu-se à análise dos requisitos do registro marcário, relegando ao oblívio o exame efetuado pelo INPI. Data vênia, atribuir a pecha de evocativa ou fraca à marca concedida pelo INPI equivale à revisão do respectivo ato administrativo, feita em descompasso com a forma estabelecida pela Lei 9.279/96 e, em última análise, pela própria CRFB/88.

De certo, todo e qualquer ato administrativo pode ser revisto judicialmente, por força da garantia estampada no art. 5°, XXXV, da CRFB/88, mas repisa-se que, em se tratando de Autarquia Federal, não se pode descurar do fato de que a revisão judicial do ato praticado pelo INPI deve tramitar perante a Justiça Federal, à luz do art. 109, I da CRFB/88.

Nada impede que a Justiça Estadual aprecie ações nas quais se busque tutela para o uso da marca, afastando eventuais violações a tal direito, notadamente em razão do caráter privado desta propriedade. À evidência, o que não se deve admitir é a revisão velada do ato do INPI, feita pela Justiça Estadual, à mingua de competência para tanto.

Tal como já exposto linhas acima, a própria LPI prevê ação de nulidade do registro, de sorte que, caso se entenda equivocado o ato de concessão de uma marca, deve-se buscar nos art. 173/175 da Lei 9.279/96 o amparo para veicular a pretensão daí decorrente. A Justiça Estadual não pode servir como via transversa para anulação do registro marcário, sob pena de malsinar não apenas o sistema de propriedade industrial, mas principalmente a repartição de competência feita pela Constituição de 1988.

Aliás, neste particular, cabe mais uma ressalva. É que, não raro, veicula-se determinada pretensão de abstenção de uso de marca perante a Justiça Estadual, mesmo estando a parte ciente de que ultrapassado o prazo de prescrição assinalado no art. 174 da Lei 9279/96, o que, por afrontar a segurança jurídica, revela a real ameaça que vem sendo impingida ao sistema de propriedade industrial.

Em suma, decisões judiciais, proferidas por órgãos da Justiça Estadual, que impõem alguma forma de mitigação a marcas concedidas pelo INPI causam inequívoco abalo no sistema de propriedade industrial, na medida em que, em boa medida, comprometem a segurança que deve cercar o sistema, gerando no usuário a sensação de fragilidade, o que pode sobremaneira arrefecer a procura pela proteção.

[...]

Não é o caso, repisa-se, de se cogitar a imposição da competência da Justiça Federal para todo e qualquer caso em que haja discussão quanto ao uso de uma marca.

Há, por certo, hipóteses em que a controvérsia é eminentemente privada, sem qualquer reflexo para o INPI.

O problema reside naqueles casos em que o ato de concessão de uma propriedade industrial é, de qualquer forma, aviltado por decisão de órgão da Justiça Estadual. A ponderação ora deduzida tem por foco justamente esses casos em que se procede a um juízo de valor sobre o ato praticado pelo INPI, sem que a Autarquia tenha tido chance de se manifestar a respeito de eventuais novos elementos anexados nos autos judiciais.

[...]

O interesse do INPI, outrossim, é de garantir a higidez do sistema de propriedade industrial, de modo que fornecerá sua contribuição sempre com esse objetivo, sendo certo que, caso se depare com hipótese de erro na concessão de marca e não tenha transcorrido o lapso prescricional previsto no art. 174 da LPI, não se furtará em reconhecer.

Não se pode olvidar, afinal, que o INPI também tem por mister a repressão à concorrência desleal, à luz do art. 20, V da Lei 9279/96, justamente porque a regulamentação da propriedade industrial se insere no contexto mais amplo do direito da concorrência, o que legitimaria ainda mais sua participação como amicus curiae.

Noutro giro, no que toca à proteção do "conjunto-imagem" ou "trade dess", segunda questão jurídica afetada como repetitiva, forçoso reconhecer que, muito embora também reflita uma propriedade intelectual, não se situa no escopo de atuação do INPI, porquanto não contemplado na Lei 9.279/96, daí porque, nesta parte, não se vislumbra qualquer interesse da Autarquia.

O Ministério Público Federal assim se manifestou:

10.                        Quanto ao primeiro tema, o certo é que esse Col. Superior Tribunal de Justiça possui precedentes em que reconhece a incompetência da Justiça Estadual, nos autos de ação de abstenção de uso indevido de marca, para julgar inválido o registro perante o INPI (art. 122 e segs. da Lei nº 9.279/96), sendo necessária, para tanto, a propositura de ação própria perante a Justiça Federal, com a participação do INPI.

11.                        E tal entendimento coincide com a leitura dos arts. 56, § 1º, e 175, ambos da Lei nº 9.279/96, os quais preveem, respectivamente, a possibilidade de alegação de nulidade do registro como matéria de defesa, bem como que a ação de nulidade do registro será ajuizada no foro da justiça federal, devendo o INPI, quando não for autor, intervir no feito.

12.                        Nesse sentido, são os acórdão prolatados nos REsp's nºs 1.189.022-SP (Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 02.04.2014) e 1.188.105-RJ (Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe de 12.04.2013, no REsp 1.281.448-SP (Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, Dje de 08.09.2014) e no AgRg no REsp 254.141/SP (Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, DJe de 28.06.2012), assim ementados:

[...]

13.                        Como ressaltou a ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL – ABPI, em sua manifestação de fls. 2.156/2.169, o raciocínio empregado por esse Col. STJ para os casos de invalidação de marca registrada pelo INPI, deve ser aplicado à hipótese de abstenção do uso de marca registrada no INPI, visto que a ordem de abstenção pressupõe que o juiz tenha suspendido os efeitos do registro da marca (o qual confere ao seu titular o direito de uso da marca com exclusividade – art. 129 da Lei nº 9.279/96).

14.                        E esse entendimento, significa a estrita observância ao disposto no art. 109, inciso I, da Constituição Federal, que estabelece ser a Justiça Federal competente para o processamento e julgamento das causas em que a União, entidade autárquica (in casu, o INPI) ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.

[...]

17.                        No que tange à proteção do conjunto-imagem ou trade dress, verifica-se que, embora ele não seja passível de registro perante o INPI (diferentemente do que ocorre com marca ou patente), conforme se verifica da leitura do art. 124 da Lei nº 9.279/96 (Dos sinais não registráveis como marca), o certo é que essa mesma lei prevê os crimes contra a concorrência desleal (art. 195 da Lei nº 9.279/96). E é exatamente nesse art. 195 que está cristalizada a proteção ao trade dress ou conjunto-imagem, independentemente de qualquer registro no INPI.

18.                        E é justamente por não haver previsão de registro do conjunto-imagem ou trade dress perante o INPI que não se trata de matéria de competência da Justiça Federal (art. 109, inciso I, da Constituição Federal), sendo, portanto, plenamente possível que, em ação de reconhecimento de concorrência desleal, a Justiça Estadual determine a abstenção de uso de tais elementos, por se tratar de lide que envolve exclusivamente interesses privados.

19.                        Esse Col. STJ possui jurisprudência de ser competente a Justiça Estadual para apreciar possível indenização devida entre particulares decorrente da prática de concorrência desleal (Resp nº 1.189.022-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma , DJe de 02.04.2014), bem como que compete à Justiça dos Estados processar e julgar ação em que o titular do registro da marca junto ao INPI pretende impedir o seu uso por terceiro (Resp nº 341.583-SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, Quarta Turma, DJ de 09.09.2002), assim ementados:

[...]

21 Pelo exposto, o Ministério Público Federal se manifesta pelo não conhecimento do agravo interno e, quanto aos temas afetos ao presente recurso repetitivo, pelo seu parcial provimento, nos termos acima delineados.

Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda. e Natura Cosméticos S.A. interpuseram "pedido de reconsideração ou agravo interno" em face do despacho de afetação (fls. 2.127-2.155), aduzindo que: a) o tema afetado não consiste em questão de direito; b) carece de multiplicidade de recursos a ensejar o exame de se saber se é possível à justiça estadual impor a abstenção de uso de marca registrada pelo INPI; c) segundo o CPC/2015, a decisão proferida pelo Juízo incompetente deve ser conservada; d) no âmbito dos tribunais estaduais "se tem reiteradamente impedido que os titulares de marcas concedidas pelo INPI, inclusive sob a apresentação nominativa, oponham esse direito de propriedade e de exclusividade em relação a terceiros" (fls. 2.146-2.147); e) "há, sim, um infindável número de acórdãos proferidos nas instâncias ordinárias, especialmente no âmbito da Justiça Estadual, que desprezam o registro já concedido pelo INPI e negam a proteção e a exclusividade conferida pelo registro, anulando-o incidentalmente, tornando-o inválido ou ineficaz, sob o fundamento de que se trataria de expressão irregistrável" (fl. 2.147); f) a questão da determinação de abstenção de uso de marca registrada no INPI "surgiu envolvida em um contexto de deslealdade concorrencial que contaminou, integralmente, o uso das expressões pelas Agravadas" (fl. 2.150).

Anoto, ainda, que o amicus curiae INPI se manifestou, às fls. 2.259-2.271, oferecendo substancioso arrazoado, asseverando que, ao contrário de sua primeira manifestação, há interesse institucional em prestar subsídios ao julgamento do presente recurso repetitivo. Na mesma linha da manifestação do Ministério Público Federal (fl. 2.275), deferi o pedido formulado, admitindo o arrazoado.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.527.232 - SP (2015/0053558-7) RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO RECORRENTE : SS INDUSTRIAL SA

RECORRENTE : SS COMÉRCIO DE COSMÉTICOS E PRODUTOS DE HIGIENE

PESSOAL LTDA

ADVOGADOS : ELIANE YACHOUH ABRÃO - SP028250

PEDRO PEREIRA DE ALVARENGA NETO E OUTRO(S) - SP275935 RECORRENTE : NATURA COSMÉTICOS S/A

RECORRENTE : INDUSTRIA E COMERCIO DE COSMETICOS NATURA LTDA ADVOGADOS : ANTONIO FERRO RICCI E OUTRO(S) - SP067143

TERESA CELINA DE ARRUDA ALVIM E OUTRO(S) - DF045472 RECORRIDO : OS MESMOS

INTERES. : FREEDOM COSMETICOS LTDA

INTERES. : ABPI - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE"

ADVOGADO : LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA E OUTRO(S) - RJ046214 INTERES. : CONFEDERACAO NACIONAL DA INDUSTRIA - "AMICUS CURIAE" ADVOGADO : CASSIO AUGUSTO MUNIZ BORGES E OUTRO(S) - DF020016A INTERES. : INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL - "AMICUS

CURIAE"

ADVOGADO : PROCURADORIA-GERAL FEDERAL - PGF - PR000000F

EMENTA

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCORRÊNCIA DESLEAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. TRADE DRESS. CONJUNTO-IMAGEM. ELEMENTOS DISTINTIVOS. PROTEÇÃO LEGAL CONFERIDA PELA TEORIA DA CONCORRÊNCIA DESLEAL. REGISTRO DE MARCA. TEMA DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL, DE ATRIBUIÇÃO ADMINISTRATIVA DE AUTARQUIA FEDERAL. DETERMINAÇÃO DE ABSTENÇÃO, POR PARTE DO PRÓPRIO TITULAR, DO USO DE SUA MARCA REGISTRADA. CONSECTÁRIO LÓGICO DA INFIRMAÇÃO DA HIGIDEZ DO ATO ADMINISTRATIVO. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA JUSTIÇA FEDERAL.

1.                                         A tese a ser firmada, para efeito do art. 1.036 do CPC/2015 (art. 543-C do CPC/1973), é a seguinte:

As questões acerca do trade dress (conjunto-imagem) dos produtos, concorrência desleal e outras demandas afins, por não envolver registro no INPI e cuidando de ação judicial entre particulares, é inequivocamente de competência da justiça estadual, já que não afeta interesse institucional da autarquia federal. No entanto, compete à Justiça Federal, em ação de nulidade de registro de marca, com a participação do INPI, impor ao titular a abstenção do uso, inclusive no tocante à tutela provisória.

2.                                         No caso concreto, dá-se parcial provimento ao recurso interposto por SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda., remetendo à Quarta Turma do STJ, para prosseguir-se no julgamento do recurso manejado por Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda. e Natura Cosméticos S.A.

VOTO

O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

2.                                        Para logo, acolho o parecer do Ministério Público Federal, não conhecendo do agravo interno, visto que o despacho de afetação - prolatado na vigência do CPC/1973 - não possui caráter decisório, não havendo, pois, interesse recursal.

Na vigência do CPC/1973, esta é a remansosa jurisprudência do STF no tocante a despacho de afetação ao rito da repercussão geral, entendimento aplicável, por analogia, ao recurso repetitivo:

Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Violação ao sigilo bancário por instituição financeira. Aplicação do disposto no art. 543-B do CPC. Irrecorribilidade da decisão que aplica a sistemática da repercussão geral. Precedentes. 3. Afronta à vedação constitucional de prisão civil por dívida. Condutas incriminadas na Lei n. 8.137/90. Tutela da ordem tributária. Caráter criminal inconfundível com a prisão por dívida. Precedente. 4. Interpretação prejudicial do silêncio do réu. Inocorrência. Pleito que demanda revolvimento do acervo probatório. Incidência do Enunciado 279 da Súmula do STF. 5. Ausência de argumentos capazes de infirmar a decisão agravada. 6. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 820993 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 19/08/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-172 DIVULG 04-09-2014 PUBLIC 05-09-2014)

3.                                        No tocante à impugnação ao arrazoado do Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI, não houve nenhuma mudança de posicionamento - a autarquia havia deixado de se manifestar acerca das teses afetadas -, e a participação do amicus curiae "no processo ocorre e se justifica, não como defensor de interesses próprios, mas como agente habilitado a agregar subsídios que possam contribuir para a qualificação da decisão a ser tomada pelo Tribunal. A presença de amicus curiae no processo se dá, portanto, em benefício da jurisdição". (ADI 3460 ED, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 12/2/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-047 DIVULG 11-3-2015 PUBLIC 12-3-2015)

Com efeito, como a manifestação do INPI foi oportuna, antes mesmo da inclusão do feito em pauta, e a relevância de sua participação reconhecida desde o despacho que o convidou - juntamente com outras entidades - a trazer subsídios ao presente julgamento, conforme antecipado na decisão de fls. 2.286-2.287, ratifico a admissão do arrazoado.

4.                                        Aprecio o recurso especial interposto por SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda. (fls. 1.658-1.680), pela sua possível prejudicialidade ao exame do outro recurso e por ser o que contém as teses afetadas.

4.1.                                 Assinalo, de início, que a conveniência da afetação, procedida na vigência do CPC/1973, foi constatada pela relevância do tema e pela verificação de multiplicidade de recursos a versarem sobre as mesmas controvérsias presentes nos autos, sendo certo que, como será demonstrado adiante, são numerosos os precedentes examinando acórdãos da justiça estadual, em que fora determinada ao titular a abstenção de uso de marca registrada no INPI.

Aliás, todos os amicus curiae e o Ministério Público Federal opinaram pela definição de tese na mesma linha da remansosa e antiga jurisprudência do STJ, e, como visto, a CNI, o INPI e as próprias recorridas admitem que "há, sim, um infindável número de acórdãos proferidos nas instâncias ordinárias, especialmente no âmbito da Justiça Estadual, que desprezam o registro já concedido pelo INPI e negam a proteção e a exclusividade conferida pelo registro, anulando-o incidentalmente, tornando-o inválido ou ineficaz" (fl. 2.147).

Nesse sentido, menciona-se a manifestação do INPI, in verbis:

Contudo, o que realmente vem sendo objeto de preocupação sistemática, por parte do INPI, é a recorrência de decisões de órgãos da Justiça Estadual que, em ações de abstenção de uso, impõem alguma forma de mitigação ao direito decorrente do registro marcário, em geral relativizando o atributo da exclusividade previsto no art. 129 da Lei 9.279/96.

A mitigação dos atributos inerentes ao registro marcário, estabelecida por órgãos da Justiça Estadual, consubstancia, a rigor, questão de direito hábil a despertar a incidência da norma prevista no art. 1.036 do NCPC. Até porque, em casos tais, diversamente do que observa no RESP em tela, a invalidação do registro efetuado pelo INPI se faz de forma velada e não explícita, induzindo um abalo imperceptível, mas importante no sistema.

[...]

Não é demais lembrar que, enquanto signatário de diversos Acordos Internacionais a respeito de propriedade industrial, o Estado Brasileiro se comprometeu a resguardar os direitos daí decorrentes, sendo certa, portanto, a absoluta necessidade de respeito e prestígio ao sistema de propriedade industrial engendrado pela Lei 9.279/96. (fls. 2.263-2.264)

4.2.                                 Outrossim, como é sabido, não se caracteriza, por si só, omissão, contradição ou obscuridade, quando o tribunal adota outro fundamento que não aquele defendido pela parte.

Dessarte, não há falar em violação ao art. 535 do CPC/1973, pois o Tribunal de origem dirimiu as questões pertinentes ao litígio, não cabendo confundir omissão, obscuridade e contradição com entendimento diverso do perfilhado pela parte.

4.3.                                 A questão controvertida principal - único objeto da afetação ao rito dos recursos repetitivos - consiste em delimitar a competência da justiça estadual em causa envolvendo suscitada violação de trade dress e marca, para definir se é possível impor, à proprietária, a abstenção de uso de marca registrada pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial - INPI.

O acórdão da apelação, no Tribunal de Justiça de São Paulo, anotou:

A meu ver, o recurso deve ser provido, para que seja determinada às rés a abstenção de fabricação e comercialização de produtos com as marcas "Jequiti Erva Doce" e "Jequiti Oro", e o uso de embalagens similares às dos produtos das requerentes indicados na inicial.

As autoras ingressaram com a presente ação buscando tutela inibitória e condenatória em face das rés, basicamente sob a alegação de que as últimas estavam praticando atos de concorrência desleal, materializados na fabricação e comercialização de cosméticos com marcas e embalagens praticamente idênticas ás das demandantes.

Segundo alegado na inicial, as requerentes são detentoras da marca mista "Natura Erva Doce" desde 1990, e da marca nominativa "HORUS" desde 1996, ambas utilizadas no ramo de cosméticos. Não obstante, as rés passaram a fabricar e comercializar produtos de beleza com as marcas "Jequiti Erva Doce" e "jequiti oro", e em embalagens muto semelhantes às das mercadorias fornecidas pelas demandantes, em evidente violação conjunto de imagem ("trade dress") de que são titulares.

[...]

Resta evidente a violação do direito marcário e a prática de concorrência desleal, pois as provas trazidas aos autos revelam exploração de prestígio alheio pelas rés.

[...]

É notório que haveria uma associação entre os produtos, decorrente da similitude das marcas, da disposição das cores e imagens entre ambos, e estou convencido de que essa parecença foi deliberadamente desejada pelas rés.

[...]

Parece razoável, portanto, que sejam as rés coibidas de empregar em seus produtos marcas e embalagens que não só deixem margem à suspeita de injusto proveito do bom nome alheio como provoquem risco de diluição das marcas das demandantes.

[...]

15. Assim, a ação deve ser julgada parcialmente procedente, apenas para que as rés se abstenham de produzir e comercializar os produtos indicados na inicial com marcas e embalagens semelhantes às das autoras, sob pena de incidência de multa diária de R$ 20.000,00.

Deverão as rés ser intimadas pessoalmente a, no prazo de noventa dias, cumprir o preceito de não fazer. O tempo é suficiente para que elaborem novas embalagens e criem nova marca, se o caso, sem prejuízo às suas atividades empresariais. (fls. 1.381, 1.382, 1.392 e 1.393)

O acórdão dos embargos de declaração nos embargos infringentes, confirmando o acórdão da apelação, dispôs:

Assim, pedem que haja manifestação sobre o uso das marcas "Jequiti Frescor de Erva Doce", "Jequiti Erva Doce +" e "Jequiti Oro", que já foram devidamente registradas no INPI, pois a única forma de obstar o uso de marcas registradas é declará-las nulas, o que só pode ser feito no âmbito da Justiça Federal.

[...]

O Julgado não mencionou expressamente a contrafação marcária e o artigo 129 da Lei 9.279/96, pois não foi considerado necessário abordar tais teses para o deslinde da demanda.

[...]

É de se ressaltar que não aceitar as teses levantadas pelas partes não configura omissão, pois estas poderão ser afastadas implicitamente. Os embargos de declaração são recurso de caráter integrativo-recuperador, assim é inviável a reapreciação do Acórdão para que se adeque às expectativas das partes, como pretende a embargante. (fls. 1.579-1.580)

No ponto, a teor do art. 10 bis da Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial - Decreto n. 635/1992 -, os países da União obrigam-se a assegurar aos nacionais proteção efetiva contra a concorrência desleal, devendo-se, particularmente, proibir-se todos os atos suscetíveis de, por qualquer meio, estabelecer confusão com o estabelecimento, os produtos ou as atividades industrial ou comercial de um concorrente.

A repressão à concorrência desleal não visa tutelar o monopólio sobre o aviamento ou a clientela, mas sim garantir a concorrência salutar, leal e os resultados econômicos.

A partir da definição da Convenção da União de Paris de concorrência desleal, prevista na alínea 2 do seu artigo 10 bis, a doutrina observa que a noção de concorrência pode variar de um país para outro, pois a noção de "usos honestos", em matéria industrial e comercial, é flexível, estabelecida de modo a se amoldar aos usos internos dos países e ao tempo, constituindo, em linhas gerais, práticas moralmente aceitas, sendo necessário recorrer aos valores e dados da realidade social e ao conjunto de princípios do regime jurídico aplicável.

Como constitui tipo aberto às transformações das práticas sociais e econômicas, sem definição precisa na lei, a jurisprudência, com auxílio da doutrina, deve definir a materialidade da concorrência desleal, caracterizada não pelos seus fins - o desvio de clientela, por si só, não é ilícito, constituindo o próprio objeto da concorrência -, mas pelos meios, isto é, a idoneidade dos atos e expedientes utilizados. (OLIVEIRA NETO, Geraldo Honório. Manual de direito das marcas. São Paulo: Pilares, 2007, p. 171-173)

Em recente precedente, a Terceira Turma perfilhou os seguintes entendimentos relacionados ao trade dress (conjunto-imagem): a) constitui a soma de elementos visuais e sensitivos que traduzem uma forma peculiar e suficientemente distintiva, vinculando-se à sua identidade visual, de apresentação do produto ou serviço no mercado consumidor; b) não se confunde com a patente, o desenho industrial ou a marca, apesar de poder ser constituído por elementos passíveis de registro, a exemplo da composição de embalagens por marca e desenho industrial; c) o conjunto-imagem de bens e produtos é passível de proteção judicial quando a utilização de conjunto similar resulte em ato de concorrência desleal, em razão de confusão ou associação com bens e produtos concorrentes (art. 209 da LPI); d) por não ser sujeito a registro - ato atributivo do direito de exploração exclusiva -, sua proteção não pode servir para ampliar direito que seria devido mediante registro, de modo que não será suficiente o confronto de marca para caracterizar a similaridade notória e presumir o risco de confusão. (REsp 1.353.451/MG, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/9/2017, DJe 28/9/2017)

A proteção ao trade dress decorre de expresso mandamento constitucional, que se constata na leitura do art. 5º, XXIX, da Lei Maior, ao estabelecer que a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos.

No ordenamento jurídico pátrio, está prevista a proteção de apenas algumas partes da mencionada "aparência visual", a qual se efetiva por meio do registro de marcas, desenhos industriais, patentes de modelo, direitos autorais, dentre outros.

O sistema brasileiro não reconhece a proteção exclusiva do "trade dress" ou "conjunto-imagem" integral, com todos os seus elementos característicos. Em regra, uma embalagem é constituída não só da marca aposta ao invólucro, mas também de diversos outros elementos distintivos e identificadores do próprio produto no mercado, como a combinação e a disposição das cores, grafias e estilizações, dos tipos de letras, e, até mesmo, o formato/tamanho da embalagem. Essa diferenciada configuração visual é capaz de identificar o produto e atrair o consumidor, pois o impulso aquisitivo é muito mais forte quando há o chamado "apelo visual" (MANARA, Cecília. ADOLFO, Luiz Gonzaga Silva; MORAES, Rodrigo (Coords.). Propriedade intelectual em perspectiva. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 10-11).

Com efeito, a decisão recorrida reconhece que o trade dress, constituído - ao contrário das marcas das recorrentes - apenas por elementos que não são registrados no INPI, é hábil a levar à confusão, induzindo o consumidor a adquirir um produto pelo outro, e impõe às corrés, ora recorrentes, que se abstenham de utilizar esses elementos que têm função "para-marcárias".

De fato, normalmente o que se efetiva é o registro da marca perante o INPI em sua apresentação nominativa (ou seja, somente o nome do produto, sem qualquer estilização), inexistindo especial atenção no sentido de se proteger os demais elementos do "trade dress", a saber: o registro da embalagem como marca mista (seus logotipos, desenhos e demais caracteres gráficos), ou, ainda, como desenho industrial, nas hipóteses previstas na Lei de Propriedade Industrial. A LPI apresenta certos parâmetros e proibições para o registro de tais elementos, que, em muitas ocasiões, não atendem à necessidade de proteção dos diversos caracteres que compõem o "trade dress" ou "conjunto-imagem".

Dessarte, cumpre observar que as questões acerca do trade dress (conjunto-imagem) dos produtos das recorrentes, por não envolver registro no INPI e se tratar de demanda entre particulares, é inequivocamente de competência da justiça estadual, já que não afeta interesse institucional da autarquia federal.

É que "[...] no Brasil, a proteção jurídica do 'trade dress' situa-se no âmbito da Repressão à Concorrência Desleal, e insurge-se contra a prática de atos de natureza fraudulenta que venham a desviar clientela de outrem, notadamente pela reprodução e/ou imitação desautorizada de características distintivas de produtos, serviços e estabelecimentos comerciais" (MANARA, Cecília. ADOLFO, Luiz Gonzaga Silva; MORAES, Rodrigo. Propriedade intelectual em perspectiva. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 10-11).

Ademais, como bem leciona Denis Borges Barbosa, não cabe ao INPI (não há interesse institucional/atribuição) reprimir diretamente a concorrência desleal, visto que sua constatação demanda procedimento a ser realizado no âmbito do Judiciário, com ampla possibilidade de produção de provas, inclusive pericial:

Em nenhuma disposição do Código de Propriedade Industrial, nem de qualquer outra lei ou tratado em vigor, se dá poderes ao INPI para atuar diretamente em matéria de Concorrência Desleal. Sem dúvida, ao denegar registro para marcas já anteriormente registradas por outrem, ou ao fazê-lo no tocante a indicações de procedência notória, o efeito indireto da ação do INPI é a tutela da concorrência leal. Mas, note-se bem, nestes casos, o Instituto aplica a norma legal específica para a qual a lei lhe dá competência e não a regra genérica de concorrência desleal, para a qual a lei deferiu competência ao Poder Judiciário.

Com efeito, ao contrário do que ocorre com as questões técnicas para as quais o INPI foi constituído, para a apuração da concorrência desleal são necessárias provas e exames de mercado, perícias contábeis, análises de concorrência, só apuráveis na instância judicial ou - talvez - em órgãos como o CADE. Desaparelhado para a análise, sem atribuições legais para fazê-la, impossível ao INPI decidir diretamente com base no dispositivo em tela.

Não se diga que, sendo a concorrência desleal parte da Propriedade Industrial, caberia naturalmente ao INPI administrá-la. Também compõe a Propriedade Industrial a proteção dos nomes empresariais, que incumbe às Juntas Comerciais.

Em suma, não há competência para o INPI aplicar diretamente a regra de concorrência desleal. Sempre tal competência recaiu no Poder Judiciário. Como ocorre nos Estados Unidos, na França, na Alemanha, e em todos os países em que a Propriedade Industrial é matéria de primeiríssima importância.

[...]

Num detalhismo minucioso, o art. 124 da Lei 9.279/98 elenca todos os casos em que se pode recusar o registro; não existe, em nenhum destes casos, poder administrativo para recusar registro no caso de "concorrência desleal". Mais ainda, não existe nem na Lei, nem em qualquer procedimento a ela subsidiário, nenhuma regra de devido processo legal para apurar a existência de uma alegada "concorrência desleal" como fundamento para denegação de registro.

[...]

Não existe "concorrência desleal potencial", como não existe propriedade, ou seja, exclusividade da marca não registrada.

Por isso, a apuração da concorrência desleal se faz num procedimento judicial plenamente sujeito ao devido processo legal, com apuração de fatos, ampla perícia, avaliação dilatada, tudo que inexiste no restrito, inespecífico e (no que toca à concorrência desleal) incompetente procedimento registral do INPI. (BARBOSA, Denis Borges. Tratado da propriedade intelectual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 516-518)

Nesse mesmo diapasão, por ocasião do julgamento do REsp 1.237.752/PR, Relator para o acórdão Ministro Marco Buzzi, a Quarta Turma perfilhou o entendimento de que o cenário fático-jurídico de concorrência desleal reclama o desenho de um comportamento - patrocinado por um operador econômico e diagnosticado no terreno negocial de certo produto ou serviço - que contrarie a conduta-dever que necessita ser observada no duelo pela clientela, via expedientes que desafiem sua idoneidade no mercado e, efetivamente, ou em potência, causem danos ao concorrente, devendo ser avaliada diante de cada caso concreto.

Consoante pontuado em artigo pela Desembargadora Federal Liliane Roriz de Almeida, com a autoridade de quem tem longa experiência nas turmas especializadas em propriedade industrial do TRF da 2ª Região, e na mesma linha do escólio de Gama Cerqueira, a solução desses casos a envolver exame de higidez de registro de marca, "via de regra, não envolve matéria fática que dependa de conhecimentos científicos ou técnicos especializados". "A pouca matéria fática útil e necessária, nesses casos - como, por exemplo, a prova do registro das marcas em confronto ou de seu uso efetivo - normalmente pode ser feita por meio de documentos juntados aos autos. Todo o resto, como a possível colidência ou a possibilidade de convivência pacífica, é matéria predominantemente de direito". (ALMEIDA, Liliane do Espírito Santo Roriz de. A necessidade de prova pericial em ações de nulidade de patente ou registro de marca. Revista da ABPI, v. 133, nov/dez. de 2014, p. 63).

Em suma, a matéria acerca do reconhecimento da violação ao trade dress e determinação de abstenção de uso de elementos "para-marcários" é de competência da justiça estadual e foi devidamente apreciada pelo enfoque da concorrência desleal, exaustivamente abordado pelas instâncias ordinárias, a patentear que, quanto ao ponto, andou bem a Corte local.

Antes da CF/1988, esse já era o antigo entendimento do STF:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. 1) NÃO CABE CONFUNDIR A AÇÃO DE NULIDADE DE PRIVILEGIO DE INVENÇÃO OU MARCA DE INDUSTRIA E COMERCIO COM A AÇÃO COMINATORIA TENDENTE A COIBIR O USO DE NOME FANTASIOSO, NÃO REGISTRADO, PASSIVEL DE INDUZIR A EQUIVOCO. SE, NA PRIMEIRA HIPÓTESE, SE ADMITE, AINDA QUE EM MEIO A CERTA CONTROVERSIA, A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL, NA SEGUNDA NÃO PAIRA DUVIDA QUANTO A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DOS ESTADOS. 2) CONFLITO CONHECIDO E DECLARADA A COMPETÊNCIA DO EGREGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE PERNAMBUCO. (CJ 6066, Relator(a): Min. LEITAO DE ABREU, Tribunal Pleno, julgado em 10/03/1977, DJ 29-04-1977 PP-02739 EMENT VOL-01056-01 PP-00070 RTJ VOL-00081-02 PP-00353)

Assim, dentro dessa linha de raciocínio, penso que é de competência da justiça estadual a apreciação de pedidos para determinação de abstenção de uso indevido de marca, desenho industrial e patente; perdas e danos; concorrência desleal, em vista da utilização indevida de sinais distintivos, que venham a ensejar desvio desleal de clientela; busca e apreensão de produtos sujeitos à ação cível e à ação penal. E também as ações para anular ou retificar registros de empresas procedidos pela Junta Comercial. Igualmente, não se descarta a possibilidade de ser dirimido, pela própria justiça estadual, eventual conflito contratual acerca de licenciamento ou cessão de marca.

A questão ora examinada, bastante recorrente, diz respeito a litígio referente à concorrência desleal, em que os litigantes são efetivamente proprietários das marcas que utilizam, registradas no INPI, embora a das rés, ora recorrentes, sejam reputadas, pelas autoras, juntamente com o trade dress, como expediente para ocasionar confusão/associação entre produtos e o consequente desvio ilícito de clientela.

De outra parte, em relação à competência da Justiça Federal para impor ao titular do registro marcário a abstenção do uso do signo, o art. 5º, XXIX, da CF/1988 - no que não destoa das constituições anteriores desde 1891 - confere a natureza de direito de propriedade à marca, ao estabelecer que a lei assegurará proteção à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos. E os incisos LII e LIV do mesmo dispositivo enunciam que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente, ou privado de seus bens sem o devido processo legal.

Dessarte, em observância ao mandamento constitucional, o art. 129 da LPI (Lei n. 9.279/1996) dispõe que a propriedade da marca adquire-se pelo registro validamente expedido (pela autarquia federal INPI), conforme as disposições desta Lei, sendo assegurado ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional.

Nessa toada, no abalizado escólio de Denis Borges Barbosa, com remissão à doutrina de Pontes de Miranda, na verdade, há direito constitucional público subjetivo de pedir a proteção, tal como assegurado na lei ordinária, postulando-se ao INPI o registro da marca, no exercício formativo gerador. Esse direito, até que ocorra o registro, não é, ainda, direito real, mas uma pretensão a que se constitua a propriedade ao fim do processo administrativo pertinente (BARBOSA, Denis Borges. Sinais distintivos e tutela judicial e administrativa: o direito constitucional dos signos distintivos. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 10-11).

Com efeito, o sistema jurídico pátrio adota o sistema atributivo para obtenção do registro de propriedade de marca. Prevê, também, num sistema de contrapesos, situações que originam direito de preferência à obtenção do registro, lastreadas na repressão à concorrência desleal e ao aproveitamento parasitário.

João da Gama Cerqueira assim discorreu sobre os efeitos do registro marcário (CERQUEIRA, João da Gama. Tratado da Propriedade Industrial. Vol. 2. Tomo 2. Parte 3. Rio de Janeiro: Revista Forense,1956, p. 76-77):

O registro torna certa a data da apropriação da marca e fixa os seus elementos, além de fazer público o ato da apropriação. Mas o seu efeito principal, como declara a lei, é assegurar ao seu titular o direito ao uso exclusivo da marca e, como consequencia, o direito de impedir que outros a empreguem para o mesmo fim.

[...]

Assegurando ao proprietário da marca o direito ao seu uso exclusivo, o registro fixa, ao mesmo tempo, a extensão desse direito. A lei protege tudo o que se acha compreendido no registro no que respeita à composição da marca como no que se refere às suas aplicações.

Destarte, a própria Lei da Propriedade Industrial veda a concessão, pelo INPI, de registros como marcas de: a) nome comercial, título de estabelecimento ou insígnia alheios (art. 124, V, e 195, V); b) sinais que reproduzem marcas que o requerente evidentemente não poderia desconhecer em razão de sua atividade, cujo titular seja sediado em país com o qual o Brasil mantenha acordo, se a marca se destinar a distinguir produto idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com aquela marca alheia (art. 124, XXIII); c) marca notoriamente conhecida em seu ramo de atividade, nos termos do art. 6º bis (I) da Convenção da União de Paris para Proteção da Propriedade Industrial.

As recorrentes sustentam que os registros de marca deferidos pela autarquia federal (INPI) conferem uso exclusivo em todo o território nacional e que, sob pena de negativa de vigência aos arts. 129 e 175 da Lei n. 9.279/1996, extrapola a competência da Justiça Estadual a determinação de abstenção de uso, pois implicaria declaração de nulidade, de competência exclusiva da Justiça Federal.

Nesse passo, a Lei de Propriedade Industrial prevê, em seu artigo 175, que a ação de nulidade de registro será ajuizada no foro da Justiça Federal, dispondo que o INPI, quando não for autor, intervirá no feito.

É cediço que a competência da Justiça Federal é estabelecida diretamente no texto constitucional e é de cursivo conhecimento que tal competência é absoluta, taxativa e, quando cível, estabelecida ratione personae.

Esta é a jurisprudência do STJ:

PROCESSO CIVIL. COMPETÊNCIA. O interesse da União, de suas autarquias e empresas públicas não basta para que a causa seja da competência da Justiça Federal; para isso é necessário que pelo menos uma dessas pessoas participe do processo na condição de autora, ré, assistente ou opoente. Conflito conhecido para declarar competente o MM. Juiz de Direito da 3ª Vara de Falências e Concordatas da Comarca do Rio de Janeiro. (CC 30.917/DF, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/03/2001, DJ 23/04/2001, p. 115)

Cumpre anotar, por oportuno, em que pese as ácidas ponderações minoritárias da doutrina acerca do art. 175 da LPI, no sentido de que a lei infraconstitucional não pode conduzir ao estabelecimento de competência da Justiça Federal. Na verdade, segundo entendo, esse ponto prevaleceria se constituísse providência desarmônica com a Constituição Federal.

No entanto, respeitado entendimento contrário, o art. 175 da LPI não cria competência nova para a Justiça Federal.

A previsão legal infraconstitucional, inequivocamente, como consignado por amici curiae e pelo Ministério Público Federal, também se extrai da própria exegese do artigo 109, I, da Constituição Federal, ao prever que compete aos juízes federais processar e julgar as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou opoentes, exceto as de falência, de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e do Trabalho.

Embora não seja a situação dos autos, mutatis mutandis, o Supremo Tribunal Federal já enfrentou a questão do pretenso afastamento das regras de definição de competência da Justiça Federal pelo art. 2º da LACP. A conclusão da Suprema Corte foi a de que a Justiça Federal também tem competência funcional e territorial sobre o local de qualquer dano, circunstância que torna as regras constitucionais de definição de sua competência rigorosamente compatíveis e harmônicas com aquelas previstas na disposição infraconstitucional.

A ementa do acórdão do STF é a seguinte:

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROMOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ART. 109, I E § 3º, DA

CONSTITUIÇÃO. ART. 2º DA LEI Nº 7.347/85. O dispositivo contido na parte final do § 3º do art. 109 da Constituição é dirigido ao legislador ordinário, autorizando-o a atribuir competência (rectius jurisdição) ao Juízo Estadual do foro do domicílio da outra parte ou do lugar do ato ou fato que deu origem à demanda, desde que não seja sede de Varas da Justiça Federal, para causas específicas dentre as previstas no inciso I do referido artigo

109. No caso em tela, a permissão não foi utilizada pelo legislador que, ao revés, se limitou, no art. 2º da Lei nº 7.347/85, a estabelecer que as ações nele previstas "serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano, cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa". Considerando que o Juiz Federal também tem competência territorial e funcional sobre o local de qualquer dano, impõe-se a conclusão de que o afastamento da jurisdição federal, no caso, somente poderia dar-se por meio de referência expressa à Justiça Estadual, como a que fez o constituinte na primeira parte do mencionado § 3º em relação às causas de natureza previdenciária, o que no caso não ocorreu. Recurso conhecido e provido.

(RE 228955, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Tribunal Pleno, julgado em 10/02/2000, DJ 24-03-2001 PP-00070 EMENT VOL-01984-04 PP-00842 REPUBLICAÇÃO: DJ 14-04-2000 PP-00056 RTJ VOL-00172-03 PP-00992)

De fato, quanto ao pedido de abstenção (inibição) do uso da marca, dúvida não há quanto à competência da Justiça Federal, até por decorrência expressa do artigo 173 da LPI, sendo a abstenção de uso uma decorrência lógica da desconstituição do registro sob o fundamento de violação do direito de terceiros. Cumpre ao juízo Federal "analisar o pedido de abstenção de uso tão somente nos estritos limites daquilo que compõe o registro marcário anulando, relegando para a Justiça Comum todo e qualquer aspecto relacionado ao conjunto-imagem (trade dress)". (Instituto Danemann Siemsen de Estudos Jurídicos e Técnicos. Comentários à lei da propriedade industrial. 3 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2013, p. 392-393)

Nesse passo, convém, ainda, sublinhar que os arts. 292, § 1º, inc. II, do CPC/1973 e o art. 327, § 1º, II, do CPC/2015 estabelecem que é requisito de admissibilidade da cumulação de pedidos, em único processo, a competência do mesmo juízo para deles conhecer.

Ademais, a conexão não determina a reunião de causas quando implicar alteração de competência absoluta (CC 118.533/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/11/2012; AgRg no CC 117.259/SC, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/06/2012).

Ora, como foi determinado à própria titular (proprietária) das marcas que se abstivesse do uso, como bem pontuado pela CNI, uma vez que do registro efetuado pela autarquia federal (INPI) decorre o direito de uso da marca, a imposição de tal abstenção é consectário lógico da nulidade, data maxima venia, gerando "a esdrúxula situação de uma das partes - seja ela o autor ou o réu - ser titular de um título de propriedade concedido pelo Estado, título este válido e legítimo, visto que não foi anulado por juiz competente, mas não poder usá-lo devidamente" (fl. 2.180).

O exame da questão esbarra em óbice de competência, pois, na verdade, estar-se-ia definindo a higidez do ato administrativo da autarquia federal, e o princípio do juiz constitucionalmente competente vem integrar as garantias do devido processo legal.

Assim, a meu juízo, fica nítido que avançou o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo determinando a abstenção do uso de marca registrada no INPI pelo seu próprio titular, no caso, as recorrentes.

Nessa linha de raciocínio, observo que consta, nos autos, e, como visto, no próprio acórdão recorrido, ter a recorrente obtido os registros das marcas, concedidos pelo INPI.

Data maxima venia, equivocou-se o Tribunal a quo, portanto, ao suprimir a competência da Justiça Federal e impor à titular a abstenção do uso de suas próprias marcas "Jequiti Frescor de Erva Doce", "Jequiti Erva Doce +" e "Jequiti Oro", que já foram devidamente registradas no INPI pelas recorrentes.

Ademais, a título de oportuno registro, há notícia, nos autos, de que a questão já está sendo discutida no âmbito da justiça federal, havendo sentença reconhecendo a higidez dos registros marcários, a caracterizar a litispendência e a existência de decisões judiciais inconciliáveis, patenteando a manifesta inconveniência do exame de tema afeto ao interesse institucional do INPI pelo Juízo estadual.

Dessarte, conforme a remansosa jurisprudência desta Corte, a Justiça Federal, e não a Justiça estadual, tem competência para, em ação de nulidade de registro de marca, com a participação do INPI, impor ao titular a abstenção do uso, inclusive no tocante à tutela provisória.

Com efeito, o que se verifica é que a decisão do Tribunal estadual ultrapassou os limites de sua competência quando extrapolou a discussão a respeito da ocorrência de concorrência desleal, concluindo pela colidência de marcas em face de imitação, no caso concreto, e determinando a abstenção do uso de marca registrada pelo próprio titular.

Esse litígio só pode ser solucionado no âmbito administrativo federal ou pela Justiça Federal, a fim de que seja previamente apreciada a validade de ambos os registros, como questão prejudicial ao pedido de abstenção de uso.

"A discussão sobre a validade de um registro de marca, patente ou desenho industrial, nos termos da LPI, tem de ser travada administrativamente ou, caso a parte opte por recorrer ao judiciário, deve ser empreendida em ação proposta perante a Justiça Federal, com a participação do INPI na causa. Sem essa discussão, os registros emitidos por esse órgão devem ser reputados válidos e produtores de todos os efeitos de direito". (REsp 1281448/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 5/6/2014, DJe 8/9/2014)

Note-se:

Havendo colidências escritas e fonéticas entre as marcas que não são possíveis de coexistência no mesmo ramo de atividade, sendo motivos para a anulação do registro na via administrativa ou na via judicial, ficando claro que na via administrativa a competência é do INPI e na via judicial é competente a Justiça Federal.

É da competência da Justiça Estadual: julgar os processos que visem a abstenção de uso de marcas, sobre o uso indevido de marcas e de patentes, perdas e danos, indenização por uso indevido ou abusivo de marcas ou de patentes, concorrência desleal, quando da utilização indevida de sinais distintivos os quais venham a ensejar desvio desleal de clientela, busca e apreensão de produtos sujeitos à ação cível e penal. As ações para anular ou retificar registro de empresas, perante a Junta Comercial é também da competência da Justiça Comum. (VIEIRA, Marcos Antonio. Propriedade industrial: marcas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 188-191)

É da competência da Justiça Federal: julgar as ações que versem sobre nulidade de registros de marca e de patentes, nos casos de nulidade de registro, o INPI - Instituto Nacional da Propriedade Industrial, obrigatoriamente, ocupa uma posição processual de litisconsorte passivo necessário, como sendo a de co-réu, pois foi ele quem concedeu indevidamente o registro da marca ou o privilégio da patente. A ação de nulidade judicial deve ser proposta contra o titular do registro [...]. A posição processual correta do INPI em tais ações é de litisconsorte passivo necessário-unitário, e não de assistente.

[...]

É comum o INPI comparecer nas ações de nulidade de registros como assistente ou simplesmente fiscal da lei, entretanto, a jurisprudência já pacificou a questão atribuindo à Autarquia a posição processual de litisconsorte passivo necessário-unitário. (VIEIRA, Marcos Antonio. Propriedade industrial: marcas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 188-191)

No mesmo sentido, mencionam-se precedentes das duas turmas de direito

privado:

PROCESSO CIVIL E COMERCIAL. MARCA. NULIDADE. DECLARAÇÃO. COMPETÊNCIA. CONTRAFAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. PROVA.

1.                           A alegação de que é inválido o registro, obtido pela titular de marca perante o INPI, deve ser formulada em ação própria, para a qual é competente a Justiça Federal. Ao Juiz estadual não é possível, incidentalmente, considerar inválido um registro vigente perante o INPI.

2.                           Na hipótese de contrafação de marca, a procedência do pedido de condenação do falsificador em danos materiais e morais deriva diretamente da prova que revele a existência de contrafação. Precedentes.

3.                           Recurso especial a que se nega provimento.

(REsp 1322718/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/06/2012, DJe 11/12/2012)

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RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. NOME COMERCIAL. MARCAS MISTAS. PRINCÍPIOS DA TERRITORIALIDADE E ESPECIFICIDADE/ESPECIALIDADE. CONVENÇÃO DA UNIÃO DE PARIS - CUP.

[...]

2.                           Não há ilegitimidade passiva do Instituto Nacional de Propriedade Industrial-INPI em ação ordinária que busca invalidar decisão administrativa proferida pela autarquia federal no exercício de sua competência de análise de pedidos de registro marcário, sua concessão e declaração administrativa de nulidade.

3.                           A tutela ao nome comercial se circunscreve à unidade federativa de competência da junta comercial em que registrados os atos constitutivos da empresa, podendo ser estendida a todo o território nacional desde que seja feito pedido complementar de arquivamento nas demais juntas comerciais. Por sua vez, a proteção à marca obedece ao sistema atributivo, sendo adquirida pelo registro validamente expedido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI, que assegura ao titular seu uso exclusivo em todo o território nacional, nos termos do art. 129, caput, e § 1º da Lei n. 9.279/1996. (REsp 1190341/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 05/12/2013, DJe 28/02/2014 e REsp 899.839/RJ, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/08/2010, DJe 01/10/2010).

[...]

9. A desconstituição do registro por ação própria é necessária para que possa ser afastada a garantia da exclusividade em todo o território nacional. (REsp 325158/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/08/2006, DJ 09/10/2006, p. 284 e REsp 1189022/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 25/02/2014, DJe 02/04/2014).

[...]

11. Recurso especial provido.

(REsp 1184867/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA

TURMA, julgado em 15/05/2014, DJe 06/06/2014)

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AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. INPI. MARCA. NULIDADE INCIDENTAL. NÃO CABIMENTO. PRECEDENTES.

1.                           Esta Corte Superior firmou entendimento de que, embora a Lei nº 9.279/96 preveja, em seu art. 56, § 1º, a possibilidade de alegação de nulidade do registro como matéria de defesa, a melhor interpretação desse dispositivo indica que ele deve estar inserido numa ação própria, na qual que discuta, na Justiça Federal, a nulidade do registro.

2.                           Agravo regimental não provido.

(AgRg no REsp 254.141/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/06/2012, DJe 28/06/2012)

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PROPRIEDADE INDUSTRIAL. MARCA COMERCIAL. REGISTRO. PROTEÇÃO. AÇÃO COMINATÓRIA.

Enquanto não for desconstituído o registro da marca no INPI, não é lícito vedar-lhe o uso pela respectiva titular.

(REsp 136812/SP, Rel. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, Rel. p/ Acórdão Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA,

julgado em 05/09/2006, DJ 02/04/2007, p. 262)

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PROPRIEDADE INDUSTRIAL. MARCA. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. ABSTENÇÃO DE USO DE MARCA. NULIDADE DE REGISTRO. MATÉRIA DE DEFESA. DECLARAÇÃO INCIDENTAL. IMPOSSIBILIDADE. NECESSÁRIA AÇÃO AUTÔNOMA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL E PARTICIPAÇÃO DO INPI. ARTIGOS ANALISADOS: ARTS. 56, §1º; 57; 175 E 205, da Lei 9.279/96.

1.                           Ação de reparação por danos materiais, compensação por danos morais e abstenção de uso de marca, ajuizada em 15.12.1999. Recurso especial concluso ao Gabinete em 11.10.2011.

2.                           Discussão relativa à possibilidade de reconhecimento incidental de nulidade ou ineficácia de registro de marca, alegada como matéria de defesa.

3.                           Não obstante exista a previsão legal expressa de que o ajuizamento da ação de nulidade de registro de marca se dará "no foro da justiça federal e o INPI, quando não for autor, intervirá no feito" (art. 175), não há qualquer disposição acerca da possibilidade de arguição da nulidade como matéria de defesa, como se dá na hipótese de ação cujo objeto seja a nulidade de patente.

4.                           Ainda que a lei preveja, em seu art. 56, §1º, a possibilidade de alegação de nulidade da patente como matéria de defesa, a melhor interpretação de tal dispositivo aponta no sentido de que ele deve estar inserido no contexto de uma ação autônoma, em que se discuta, na Justiça Federal, o próprio registro.

5.                           Não faria sentido exigir que, para o reconhecimento da nulidade pela via principal, seja prevista uma regra especial de competência e a indispensável participação do INPI, mas para o mero reconhecimento incidental da invalidade do registro não se exija cautela alguma. Interpretar a lei deste modo equivaleria a conferir ao registro perante o INPI uma eficácia meramente formal e administrativa.

6.                           A discussão sobre a validade de um registro de marca, patente ou desenho industrial, nos termos da LPI, tem de ser travada administrativamente ou, caso a parte opte por recorrer ao judiciário, deve ser empreendida em ação proposta perante a Justiça Federal, com a participação do INPI na causa. Sem essa discussão, os registros emitidos por esse órgão devem ser reputados válidos e produtores de todos os efeitos de direito.

7.                           Recurso especial provido.

(REsp 1281448/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 05/06/2014, DJe 08/09/2014)

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PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA. DOMÍNIO DA INTERNET. UTILIZAÇÃO POR QUEM NÃO TEM O REGISTRO DA MARCA NO INPI.

A Justiça Estadual é competente para processar e julgar ação em que o titular, junto ao INPI, do registro da marca tantofaz.com, sob a especificação de portal da internet, pretende impedir o seu uso por outrem.

Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

(REsp 341.583/SP, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 06/06/2002, DJ 09/09/2002, p. 231)

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RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. CONCORRÊNCIA DESLEAL. JUSTIÇA ESTADUAL. ABSTENÇÃO DE USO DE MARCA REGISTRADA PELO PRÓPRIO TITULAR. JUSTIÇA FEDERAL. COMPETÊNCIA. NECESSÁRIA PARTICIPAÇÃO DO INPI. VIOLAÇÃO AO ART. 129 DA LEI DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL.

1.                                                                                    Inexiste violação do art. 535 do Código de Processo Civil se todas as questões jurídicas relevantes para a solução da controvérsia são apreciadas, de forma fundamentada, sobrevindo, porém, conclusão em sentido contrário ao almejado pela parte.

2.                                                                                    A apreciação quanto à possível indenização devida entre particulares decorrente da prática de concorrência desleal é competência da Justiça estadual. Precedente.

3.                                                                                    Compete ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial- INPI avaliar uma marca como notoriamente conhecida. Precedente.

4.                                                                                    A desconstituição do registro por ação própria é necessária para que possa ser afastada a garantia da exclusividade em todo o território nacional. (REsp 325158/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/08/2006, DJ 09/10/2006, p. 284). Não há previsão legal para autorizar a retirada da eficácia de ato administrativo de concessão de registro marcário sem a participação do INPI e sem o ajuizamento de prévia ação de nulidade na Justiça Federal.

5.                                                                                    Recurso especial provido.

(REsp 1189022/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 25/02/2014, DJe 02/04/2014)

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PROPRIEDADE INDUSTRIAL MARCA - NÃO SE PODE IMPEDIR O USO DA MARCA, E A EXCLUSIVIDADE, A QUEM E TITULAR DE REGISTRO NO ORGÃO PROPRIO. VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 59 DO CODIGO DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL. NOME COMERCIAL - O REGISTRO NA JUNTA COMERCIAL PRODUZ EFICACIA EM TODO O TERRITORIO NACIONAL. O ULTERIOR REGISTRO POR TERCEIRO, COMO MARCA, DE EXPRESSÃO DE FANTASIA QUE NELE FIGURA NÃO IMPEDE QUE CONTINUE A SER UTILIZADO.

(REsp 11767/SP, Rel. Ministro EDUARDO RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 29/06/1992, DJ 24/08/1992, p. 12997)

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NOME COMERCIAL PROTEÇÃO DECORRENTE DO DISPOSTO NO ARTIGO 8. DA CONVENÇÃO DA UNIÃO DE PARIS. DESNECESSIDADE DE QUE HAJA SIDO FEITO O REGISTRO NO BRASIL. MARCA - REGISTRO NÃO SE PODE VEDAR O USO A QUEM E TITULAR DO REGISTRO. A ANULAÇÃO DESSE HAVERA DE SER PLEITEADA EM AÇÃO DIRETA. (REsp 36898/SP, Rel. Ministro EDUARDO RIBEIRO, TERCEIRA TURMA,

julgado em 01/03/1994, DJ 28/03/1994, p. 6316)

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PROCESSO CIVIL E COMERCIAL. DESENHO INDUSTRIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DE REGISTRO. COMPETÊNCIA.

1.                           A discussão sobre a validade de um registro de desenho industrial, nos termos da Lei, deve ser travada administrativamente ou, caso a parte opte por recorrer ao Poder Judiciário, deve ser empreendida em ação proposta frente à Justiça Federal, com a participação do INPI. Sem essa discussão, os registros emitidos por esse órgão devem ser reputados válidos e produtores de todos os efeitos de direito.

2.                           Recurso especial provido.

(REsp 1251646/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/12/2012, DJe 04/02/2013)

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COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL - MARCA - REGISTRO - CARENCIA DA AÇÃO.

I                              - A MARCA REGULARMENTE REGISTRADA NO INPI, SEM QUE CONTRA A MESMA SE TENHA LEVANTADO IMPUGNAÇÕES, CONFERE A SEU TITULAR A PROPRIEDADE E USO, EIS QUE TEM VALIDADE ERGA OMNES. ASSIM, ENQUANTO PERSISTIR O SEU REGISTRO, TEM-SE COMO CARENTE DE AÇÃO, A AJUIZADA CONTRA O SEU LEGITIMO DETENTOR.

II                             - RECURSO NÃO CONHECIDO.

(REsp 9415/SP, Rel. Ministro WALDEMAR ZVEITER, TERCEIRA TURMA,

julgado em 04/06/1991, DJ 01/07/1991, p. 9193)

5.                                         A tese, portanto, do recurso repetitivo, é a seguinte:

As questões acerca do trade dress (conjunto-imagem) dos produtos, concorrência desleal e outras demandas afins, por não envolver registro no INPI e cuidando de ação judicial entre particulares, é inequivocamente de competência da justiça estadual, já que não afeta interesse institucional da autarquia federal. No entanto, compete à Justiça Federal, em ação de nulidade de registro de marca, com a participação do INPI, impor ao titular a abstenção do uso, inclusive no tocante à tutela provisória.

6.                                         No tocante ao recurso interposto por Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda. e Natura Cosméticos S.A. (fls. 1.584-1.618), não há matéria afetada ao rito dos recursos repetitivos, devendo ser julgado pelo Juízo natural (Quarta Turma).

7.                                         No caso concreto, dou parcial provimento ao recurso especial interposto por SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda., para, em reconhecimento da incompetência da justiça estadual, afastar a determinação de abstenção de uso de suas próprias marcas registradas.

Após o trânsito em julgado da presente decisão, voto pelo retorno dos autos à Quarta Turma, para o julgamento do outro recurso especial, interposto por Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda. e Natura Cosméticos S.A. (fls. 1.584-1.618), cabendo àquele órgão julgador apreciar também a questão relacionada aos ônus da sucumbência.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO SEGUNDA SEÇÃO

Número Registro: 2015/0053558-7 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.527.232 / SP

Números Origem: 01918615720098260100 1918615720098260100 5830020091918610

PAUTA: 22/11/2017 JULGADO: 13/12/2017

Relator

Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

Presidente da Sessão

Exmo. Sr. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. SADY D´ASSUMPÇÃO TORRES FILHO

Secretária

Bela. ANA ELISA DE ALMEIDA KIRJNER

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : SS INDUSTRIAL SA

RECORRENTE : SS COMÉRCIO DE COSMÉTICOS E PRODUTOS DE HIGIENE PESSOAL LTDA

ADVOGADOS : ELIANE YACHOUH ABRÃO - SP028250

PEDRO PEREIRA DE ALVARENGA NETO E OUTRO(S) - SP275935 RECORRENTE : NATURA COSMÉTICOS S/A

RECORRENTE : INDUSTRIA E COMERCIO DE COSMETICOS NATURA LTDA ADVOGADOS : ANTONIO FERRO RICCI E OUTRO(S) - SP067143

TERESA CELINA DE ARRUDA ALVIM E OUTRO(S) - DF045472

RECORRIDO : OS MESMOS

INTERES. : FREEDOM COSMETICOS LTDA

INTERES. : ABPI - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DA PROPRIEDADE INTELECTUAL - "AMICUS CURIAE"

ADVOGADO : LUIZ EDGARD MONTAURY PIMENTA E OUTRO(S) - RJ046214 INTERES. : CONFEDERACAO NACIONAL DA INDUSTRIA - "AMICUS CURIAE" ADVOGADO : CASSIO AUGUSTO MUNIZ BORGES E OUTRO(S) - DF020016A

INTERES. : INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL - "AMICUS CURIAE"

ADVOGADO : PROCURADORIA-GERAL FEDERAL - PGF - PR000000F

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas - Propriedade - Propriedade Intelectual / Industrial - Marca

SUSTENTAÇÃO ORAL

Sustentaram oralmente a Dra. Teresa Arruda Alvim, pelas recorrentes Natura Cosméticos S.A. e Outra, e a Advogada da União, Dra. Indira Ernesto Silva, pelo interessado Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI.

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEGUNDA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Seção, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso interposto pelas recorrentes SS Industrial S.A. e SS Comércio de Cosméticos e Produtos de Higiene Pessoal Ltda, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Para os fins do art. 1.036, do CPC/2015, foi fixada a seguinte tese repetitiva: "As questões acerca do trade dress (conjunto-imagem) dos produtos, concorrência desleal e outras demandas afins, por não envolver registro no INPI e cuidando de ação judicial entre particulares, é inequivocamente de competência da justiça estadual, já que não afeta interesse institucional da autarquia federal. No entanto, compete à Justiça Federal, em ação de nulidade de registro de marca, com a participação do INPI, impor ao titular a abstenção do uso, inclusive no tocante à tutela provisória."

Quanto ao recurso interposto pelas recorrentes Indústria e Comércio de Cosméticos Natura Ltda e Natura Cosméticos S.A., a Seção, por unanimidade, decidiu pela remessa dos autos à Quarta Turma (Juízo Natural), por não haver matéria afetada ao rito dos recursos repetitivos, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, Lázaro Guimarães (Desembargador convocado do TRF 5ª Região) e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.