Registro: 2020.0000732791
ACÓRDÃO
Vistos,
relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº
1024649-56.2017.8.26.0506, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante
GIUSEPPE SILVA BORGES STUCKERT, são apelados MUNDIAL TURISMO -
OPERADORA
E AGENCIA DE VIAGENS LTDA – ME, DFG PRODUÇÕES LTDA (SALVADOR FOLIA) e CATIVA
TURISMO LTDA.
ACORDAM, em
4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a
seguinte decisão: "Em julgamento estendido, por maioria de votos, deram
provimento, em parte, ao recurso, vencidos o 3º e o 4º Juízes que davam
provimento. Fará declaração de voto o 3º Juiz.", de conformidade com o
voto do Relator, que integra este acórdão.
O
julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ALCIDES LEOPOLDO
(Presidente), ENIO ZULIANI, FÁBIO QUADROS E NATAN ZELINSCHI DE ARRUDA.
São
Paulo, 3 de setembro de 2020.
MAURÍCIO CAMPOS DA SILVA VELHO RELATOR
Assinatura
Eletrônica
VOTO
Nº 4198
PROCESSO
Nº: 1024649-56.2017.8.26.0506
CLASSE
ASSUNTO: APELAÇÃO CÍVEL - DIREITO AUTORAL COM REVISÃO
APELANTE:
GIUSEPPE SILVA BORGES STUCKERT
APELADO:
MUNDIAL TURISMO - OPERADORA E AGÊNCIA DE VIAGENS LTDA E OUTROS
APELAÇÃO. Direito autoral. Obra
Fotográfica. Uso indevido. Dano moral e material. Proteção legal (art. 7º, VII,
Lei 7.610/98). Dever de indenizar que exsurge da vantagem não recebida pelo uso
não autorizado de obra. Sentença de improcedência. Irresignação parcialmente
procedente. Obra fotográfica. Caracterização como obra artística que independe
de análise subjetiva. Proteção ao direito autoral que é conferida desde a sua
criação. Inexistência de prova de que a criação da obra pertence a terceiro e
que a disponibilização dela seria anterior àquela feita pelo autor em seus
perfis na internet. Ônus do qual as rés não se desincumbiram. Contrafação
comprovada. Indenização por dano material que depende de liquidação.
Indenização por dano moral. Dano in re ipsa. Arbitramento em R$1.500,00.
Obrigação de inserir errata acerca da sua autoria, no local em que divulgada,
sob pena de multa. Sentença reformada. Recurso a que se dá parcial provimento.
I
RELATÓRIO
Trata-se
de recuso de apelação em face de sentença que julgou extinta sem resolução do
mérito a ação ajuizada em face de MUNDIAL TURISMO OPERADORA E AGÊNCIA DE
VIAGENS LTDA, CATIVA TURISMO LTDA. e FOCO MULTIMÍDIA (DFG PRODUÇÕES LTDA com
aplicação de pena de litigância de má-fé.
Insurge-se
o apelante sustentando que é autor da obra fotográfica e que não autorizou seu
uso, tendo direito à indenização por dano material e moral e de ver a ré ser
obrigada a comunicar ao público que a obra contrafeita lhe pertence. Assim,
pleiteia a integral procedência da ação, com afastamento da pena de litigância
de má-fé e inversão do ônus de sucumbência.
Recurso tempestivo, preparado e
contra arrazoado. Houve oposição ao
julgamento virtual.
É o relatório.
II
VOTO
A
pretensão do autor foi rechaçada sob o argumento de que a fotografia de
paisagens naturais não integraria o conceito de obra fotográfica, previsto na
Lei dos Direitos Autorais. Entretanto, com a devida vênia, o conceito adotado
pelo E. Juízo de primeira instância é ultrapassado.
Na
antiga Lei de Direitos Autorias, o art. 6º, inciso VII, afirmava-se que seriam
obras intelectuais as criações do espírito, de qualquer modo exteriorizadas,
tais como as obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo
ao da fotografia, desde que,
pela escolha de seu objeto e pelas condições de sua execução, pudessem ser
consideradas criação artística.
Ocorre
que a atual Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/98) transcendeu essas
exigências e abriu o conceito de fotografia caracterizando-a, sem restrições,
como manifestação artística protegida. O legislador desconsiderou qualquer
aferição subjetiva do observador para enquadrá-la como obra artística;
respeitando, assim, acima de tudo, a criatividade daquele que capturou o
registro, escolhendo o ângulo mais adequado, o melhor filme, lente apropriada,
posição da luz, a melhor localização e a composição da imagem, entre outros
atributos criativos.
Com
efeito, a proteção à autoria de obras fotográficas é conferida desde a sua
criação (art. 18, L. 9610/98) e nos autos há farta prova documental de que os
registros fotográficos contrafeitos foram criados pelos autor e publicados em
redes sociais de compartilhamento de imagens, dentro de perfis identificados
pelo seu nome, muito antes das campanhas de marketing
realizadas pelas rés.
A
internet não torna de domínio público
tudo aquilo que lá se acha inserido. O ambiente virtual para fotógrafos é uma
espécie de vitrine destinada a divulgar seu trabalho artístico e, pelo simples
fato de estarem expostas, não significa que lá se encontrem para livre
utilização ou disponibilização por qualquer um. A obra fotográfica é bem de
propriedade de quem a produziu, ou de quem detenha seus direitos, e sua
utilização, para qualquer finalidade, deve ser precedida da autorização, a
título oneroso ou gratuito, a critério do autor, o fotógrafo.
Não
bastasse isso, o próprio provedor de pesquisa de imagens anuncia, ao mostrar as
imagens relacionadas à busca feita, que elas podem ser protegidas por direitos
autorais recomendando consulta a material explicativo por ele disponibilizado.
E
era ônus das rés demonstrar a alegação feita na defesa de que as fotos foram
criadas por outro fotógrafo antes da disponibilização feita pelo autor em seus
perfis; embora a corré CATIVA tenha afirmado isso, não conseguiu demonstrar com
meridiana clareza que os registros nos sítios www.quierobrasil.com/las-playas-de-maceio-informacion-y-
fotos/ e www.panoramio.com/user/7449870 e www.panoramio.com/photo/88243639 são
anteriores ao registro de criação feito pelo autor no sítio “flikr” em
21/02/2014 (fls. 49). Não há indicação clara das datas de registro feitas
nestes sites (a cópia juntada está
cortada justamente na data de inserção) e a página panoramio, como a própria corré afirmou, está extinta, não sendo
possível a verificação ictu oculi.
As
rés, portanto, não lograram demonstrar que outra pessoa foi a criadora da obra
fotográfica. Assim, deve-se reconhecer que assiste ao autor o direito de ser
indenizado, nos termos do art. 29, I, da Lei n. 9.610/98.
O
autor, entretanto, não demonstrou que o valor pleiteado na inicial, pelo uso
das suas fotografias, está em harmonia com os preços praticados pelo mercado.
Não trouxe aos autos nenhum parâmetro para fundamentar o arbitramento judicial.
O valor da indenização, portanto, deve ser objeto de liquidação de sentença.
Em
relação aos danos morais, é de se ver que eles se configuram in re ipsa, da própria ocorrência da
publicação desautorizada, cuja prova está fartamente demonstrada nos autos.
Assim, considerando o comportamento da ré de se ter utilizado de uma das obras
fotográficas produzidas pelo autor, para fins comerciais, e levando em conta
que o autor tem como atividade profissional a exploração de suas obras fotográficas,
é razoável a fixação da indenização por dano moral em R$1.500,00, valor este
que se afigura suficiente para emprestar à condenação caráter punitivo e
pedagógico. Nesse passo, observo que o autor já manejou mais de 500 ações
similares contra empresas do setor turístico e hoteleiro, o que exige maior
ponderação na fixação da indenização, para se evitar seu enriquecimento sem
causa.
Confira-se,
a propósito, julgamentos desta E. Câmara em caso análogo:
Apelação.
Ação cominatória c.c. indenizatória. Direito autoral. Fotografia. Dano moral e
material. Veiculação de trabalho fotográfico produzido pelo autor sem seu
consentimento. Sentença de improcedência. Irresignação do autor parcialmente
procedente. Proteção legal da imagem (art. 7º, VII, Lei 7.610/98). Dever de
indenizar que exsurge da vantagem não recebida pelo uso de obra, não se
exigindo mais do que a própria publicação desautorizada para verificá-lo, cuja
prova se encontra fartamente reproduzida nos autos. Fixação da indenização por
dano material, assim como da indenização
por dano moral em R$1.500,00. Pedido de veiculação da autoria da fotografia
em jornais de grande circulação afastado. Pedido de abstenção de uso da
fotografia, sob pena de multa diária, acolhido. Astreintes fixadas em R$500,00
(quinhentos reais) ao dia. Sentença reformada. Recurso a que se dá parcial
provimento.
(TJSP;
Apelação Cível 1023302-85.2017.8.26.0506; Relator (a): Maurício Campos da Silva
Velho; Órgão Julgador: 4ª Câmara de Direito Privado; Foro de Ribeirão Preto -
10ª Vara Cível; Data do Julgamento: 22/11/2018; Data de Registro: 30/11/2018)
Por
derradeiro, afigura-se incabível exigir da ré publicação em jornais de ampla
circulação divulgando a informação acerca da autoria da foto contrafeita porque
não se trouxe aos autos nenhuma prova de que tenha ela se utilizado da obra
fotográfica para estratégia de marketing por meio desse tipo de veículo de comunicação.
Contudo, é razoável que a errata seja publicada no ambiente em que se deu a
indevida utilização da fotografia antes que se suspenda o uso da imagem.
Destarte,
o recurso merece parcial provimento.
III DECISÃO
Diante do exposto, pelo meu
voto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao
recurso para: i() Condenar a ré ao pagamento de indenização por dano material a ser apurada em liquidação de
sentença;
ii() Condenar a ré ao pagamento de indenização por dano moral arbitrada em
R$1.500,00, com atualização monetária
a partir deste julgamento e incidência de juros moratórios de 1% ao mês desde a
data da publicação indevida das fotos.
iii()
Compelir a ré, nos termos do artigo 108, III, da Lei nº 9.610/98, antes de retirar
as publicações do seu sítio eletrônico, inserir
os créditos de autoria nas fotos publicadas, pelo prazo de 10 (dez) dias,
sob pena de incidência de multa diária no valor de R$500,00; caso já tenha
retirado a foto, deverá fazer publicação específica a respeito, observando o
prazo assinalado.
Em
razão o resultado deste julgamento, arcará a ré integralmente com as custas e
despesas processuais despendidas e honorários advocatícios do patrono do autor
ora arbitrados em 15% do valor da condenação.
Por
derradeiro, dou por expressamente debatidos todos os dispositivos legais e constitucionais
veiculados na análise deste recurso, considerando que não cabe ao julgador o
enfrentamento de todas as teses articuladas pelas partes.
MAURÍCIO
CAMPOS DA SILVA VELHO
Relator
Voto nº 40317
Apelação Cível nº
1024649-56.2017.8.26.0506 Comarca: Ribeirão Preto
Apelante: Giuseppe Silva Borges
Stuckert
Apelados: Mundial Turismo -
Operadora e Agência de Viagens Ltda Me e outros
DECLARAÇÃO
DE VOTO
O ilustre Desembargador Relator
Dr. Maurício Campos da Silva Velho apresentou voto (4198) negando provimento ao
recurso de apelação interposto por pessoa jurídica contra decisão de
procedência de ação garantidora de direitos autorais, promovida por autor de
fotografia utilizada sem autorização.
Ouso divergir de tal
posicionamento.
Não se nega ao autor de obra
fotográfica utilizada por terceiro, sem a devida autorização, o direito de
proteção ao direito autoral, mas o fato é que não há originalidade na
fotografia de paisagem ou acidente geográfico naturais, expostos a todos,
inclusive, para que sejam retratados livremente.
No caso dos autos, a fotografia
foi postada pelo fotógrafo em rede social, sem qualquer anotação de proibição
de reprodução.
Não pode querer se apoderar de
imagem que nada mais é do que mera reprodução daquilo de livre exposição.
Pelo provimento do recurso.
FÁBIO
QUADROS
3º
Juiz
Este documento é cópia do
original que recebeu as seguintes assinaturas digitais:
P g. inicial |
P g. final |
Categor ia |
Nome do assinante |
Confirmaç ão |
1 |
6 |
Acórdão s Eletrônicos |
MAURICIO CAMPOS DA SILVA VELHO |
126B2A19 |
7 |
6 |
Declaraç ões de Votos |
FABIO DE OLIVEIRA QUADROS |
12705D88 |
Para conferir o original acesse
o site: https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do,
informando o processo 1024649-56.2017.8.26.0506 e o código de confirmação da
tabela acima.