RECURSO
ESPECIAL Nº 1.782.024 - RJ (2018/0173938-7)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE
: RECANTO - CONSULTORIA, INFORMATICA E PROMOCOES LTDA ADVOGADOS : GIORGIA CRISTIANE
PACHECO - PR023776
EDUARDO GUSTAVO PACHECO -
PR027185
FABIO RODRIGUES
GUIMARÃES DA SILVA E OUTRO(S) - RJ126478 RECORRIDO : SAO PAULO FUTEBOL CLUBE
ADVOGADOS
: CARLOS MIGUEL CASTEX AIDAR - SP022838
ULYSSES ECCLISSATO NETO -
SP182700
RECORRIDO
: INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL.
AÇÃO DE NULIDADE DE MARCA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA.
PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL. ART. 174 DA LEI 9.279/96.
1.
Ação
ajuizada em 14/1/2010. Recurso especial interposto em 12/12/2016. Autos conclusos
à Relatora em 25/10/2018.
2.
O
propósito recursal, além de verificar se houve negativa de prestação jurisdicional,
é definir (i) se a pretensão anulatória
está prescrita; (ii) se houve cerceamento
de defesa ou má valoração da prova; (iii)
se o julgamento foi extra petita;
e (iv) se deve ser declarada a nulidade
da marca titulada pela recorrente.
3.
Devidamente
analisadas e discutidas as questões deduzidas pelas partes, não há que se
cogitar de negativa de prestação jurisdicional, ainda que o resultado do julgamento
contrarie os interesses da recorrente.
4.
O
diploma legal que trata especificamente de questões envolvendo direito de
propriedade industrial – Lei 9.279/96 – contém regra expressa acerca da questão
controvertida, dispondo que a pretensão de se obter a declaração de nulidade de
registro levado a efeito pelo INPI prescreve em cinco anos, contados da data da
sua concessão (art. 174).
5.
Mesmo
tratando-se de ato administrativo contaminado por nulidade, os efeitos dele decorrentes
não podem ser afastados se entre a data de sua prática e o ajuizamento da ação
já houve o transcurso do prazo prescricional previsto para incidência na correspondente
hipótese fática, salvo flagrante inconstitucionalidade. Precedentes.
6.
Entender
que a ação de nulidade de marca é, em regra, imprescritível equivale a esvaziar
o conteúdo normativo do dispositivo precitado, fazendo letra morta da opção legislativa
e gerando instabilidade, não somente aos titulares de registro, mas também a todo
o sistema de defesa da propriedade industrial.
7.
Ademais,
a imprescritibilidade não constitui regra no direito brasileiro, sendo admitida
somente em hipóteses excepcionalíssimas que envolvem direitos da personalidade,
estado das pessoas, bens públicos. Os demais casos devem se sujeitar aos prazos
prescricionais do Código Civil ou das leis especiais. Precedente.
8.
Hipótese
concreta em que a ação anulatória foi ajuizada depois de transcorrido o prazo quinquenal
estabelecido na lei especial, sendo impositiva a decretação da prescrição da pretensão
anulatória.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes
autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça,
na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade,
dar provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra
Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva,
Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 07 de maio de
2019(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.782.024 - RJ (2018/0173938-7)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE
: RECANTO - CONSULTORIA, INFORMATICA E PROMOCOES LTDA ADVOGADOS : GIORGIA CRISTIANE
PACHECO - PR023776
EDUARDO GUSTAVO PACHECO -
PR027185
FABIO RODRIGUES
GUIMARÃES DA SILVA E OUTRO(S) - RJ126478 RECORRIDO : SAO PAULO FUTEBOL CLUBE
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: CARLOS MIGUEL CASTEX AIDAR - SP022838
ULYSSES ECCLISSATO NETO -
SP182700
RECORRIDO
: INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL
RELATÓRIO
A
EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
Cuida-se
de recurso especial interposto por RECANTO - CONSULTORIA, INFORMÁTICA E PROMOÇÕES
LTDA, com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional.
Ação: de
nulidade de ato administrativo, ajuizada por SÃO PAULO FUTEBOL CLUBE em face da
recorrente e do INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL (INPI), por meio
da qual objetiva a anulação do registro da marca mista ST SÓCIO TORCEDOR.
Sentença: julgou
parcialmente procedente o pedido, para “determinar que o INPI consigne no
registro marcário nº 819.816.027, da marca mista ST SÓCIO TORCEDOR, a não
exclusividade de uso do elemento nominativo SÓCIO TORCEDOR” (e-STJ fl. 316).
Acórdão: (i) negou
provimento à remessa necessária; (ii) deu
parcial provimento ao recurso adesivo da recorrida, para “afastar a prescrição
prevista no art. 174 da LPI, mantendo, porém a determinação prevista na sentença,
para que o INPI promova o apostilamento no registro da marca mista ST SÓCIO TORCEDOR
(registro n° 819.816.027), a fim de que passe a constar a 'não exclusividade de
uso dos elementos nominativos SÓCIO TORCEDOR'” (e-STJ fl. 504) e (iii) julgou prejudicada a apelação da
recorrente.
Embargos de declaração:
interpostos pela recorrente, foram parcialmente
acolhidos, para “sanar as omissões e corrigir a contradição do acórdão embargado,
de maneira a negar provimento à remessa necessária e ao recurso de apelação da embargante
e dar parcial provimento ao recurso adesivo da 1° embargada” (e-STJ fl. 578).
Embargos
de declaração: interpostos
pela recorrente, foram rejeitados.
Recurso
especial: aponta
violação dos artigos 141, 156, 355, I, 375,
492,
997, 1.013 e 1.022, I e II, do CPC/15, 124, VI, e 174 da Lei da Propriedade
Industrial (Lei 9.279/96). Além de negativa de prestação jurisdicional, alega que
a pretensão anulatória deduzida pela recorrida está prescrita, pois decorridos
mais de cinco anos entre a concessão do registro marcário e o ajuizamento da
ação. Entende que, além de cerceamento de defesa, houve má valoração da prova, pois
inexiste elemento nos autos a indicar que a expressão “sócio torcedor” fora utilizada
em momento anterior à data em que registrada sua marca. Afirma que o exame de
registrabilidade é feito pelo INPI, devendo levar em conta apenas o contexto
fático-jurídico existente até a prolação do ato administrativo de concessão.
Aduz que o sinal impugnado não guarda relação com os serviços identificados
pela marca, não havendo, portanto, impedimento ao registro. Assevera que o
julgamento extrapolou os limites do pedido.
Juízo de
admissibilidade: o Tribunal de origem negou seguimento à
irresignação da recorrente, tendo sido interposto agravo da decisão
denegatória, o qual, por ocasião do julgamento do subsequente agravo interno,
foi convertido em recurso especial.
É
o relatório.
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.782.024 - RJ (2018/0173938-7)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE
: RECANTO - CONSULTORIA, INFORMATICA E PROMOCOES LTDA ADVOGADOS : GIORGIA CRISTIANE
PACHECO - PR023776
EDUARDO GUSTAVO PACHECO -
PR027185
FABIO RODRIGUES
GUIMARÃES DA SILVA E OUTRO(S) - RJ126478 RECORRIDO : SAO PAULO FUTEBOL CLUBE
ADVOGADOS
: CARLOS MIGUEL CASTEX AIDAR - SP022838
ULYSSES ECCLISSATO NETO -
SP182700
RECORRIDO
: INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL.
AÇÃO DE NULIDADE DE MARCA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA.
PRESCRIÇÃO. PRAZO QUINQUENAL. ART. 174 DA LEI 9.279/96.
1.
Ação
ajuizada em 14/1/2010. Recurso especial interposto em 12/12/2016. Autos conclusos
à Relatora em 25/10/2018.
2.
O
propósito recursal, além de verificar se houve negativa de prestação jurisdicional,
é definir (i) se a pretensão anulatória
está prescrita; (ii) se houve cerceamento
de defesa ou má valoração da prova; (iii)
se o julgamento foi extra petita;
e (iv) se deve ser declarada a nulidade
da marca titulada pela recorrente.
3.
Devidamente
analisadas e discutidas as questões deduzidas pelas partes, não há que se
cogitar de negativa de prestação jurisdicional, ainda que o resultado do julgamento
contrarie os interesses da recorrente.
4.
O
diploma legal que trata especificamente de questões envolvendo direito de
propriedade industrial – Lei 9.279/96 – contém regra expressa acerca da questão
controvertida, dispondo que a pretensão de se obter a declaração de nulidade de
registro levado a efeito pelo INPI prescreve em cinco anos, contados da data da
sua concessão (art. 174).
5.
Mesmo
tratando-se de ato administrativo contaminado por nulidade, os efeitos dele decorrentes
não podem ser afastados se entre a data de sua prática e o ajuizamento da ação
já houve o transcurso do prazo prescricional previsto para incidência na correspondente
hipótese fática, salvo flagrante inconstitucionalidade. Precedentes.
6.
Entender
que a ação de nulidade de marca é, em regra, imprescritível equivale a esvaziar
o conteúdo normativo do dispositivo precitado, fazendo letra morta da opção legislativa
e gerando instabilidade, não somente aos titulares de registro, mas também a todo
o sistema de defesa da propriedade industrial.
7.
Ademais,
a imprescritibilidade não constitui regra no direito brasileiro, sendo admitida
somente em hipóteses excepcionalíssimas que envolvem direitos da personalidade,
estado das pessoas, bens públicos. Os demais casos devem se sujeitar aos prazos
prescricionais do Código Civil ou das leis especiais. Precedente.
8.
Hipótese
concreta em que a ação anulatória foi ajuizada depois de transcorrido o prazo quinquenal
estabelecido na lei especial, sendo impositiva a decretação da prescrição da pretensão
anulatória.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
RECURSO
ESPECIAL Nº 1.782.024 - RJ (2018/0173938-7)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE
: RECANTO - CONSULTORIA, INFORMATICA E PROMOCOES LTDA ADVOGADOS : GIORGIA CRISTIANE
PACHECO - PR023776
EDUARDO GUSTAVO PACHECO -
PR027185
FABIO RODRIGUES
GUIMARÃES DA SILVA E OUTRO(S) - RJ126478 RECORRIDO : SAO PAULO FUTEBOL CLUBE
ADVOGADOS
: CARLOS MIGUEL CASTEX AIDAR - SP022838
ULYSSES ECCLISSATO NETO -
SP182700
RECORRIDO
: INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL
VOTO
A
EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):
O
propósito recursal, além de verificar se houve negativa de prestação
jurisdicional, é definir (i) se a
pretensão anulatória está prescrita; (ii)
se houve cerceamento de defesa ou má valoração da prova; (iii) se o julgamento foi extra petita; e (iv) se deve ser declarada a nulidade da marca ST SÓCIO TORCEDOR.
1.
DA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO
JURISDICIONAL
Da
análise do acórdão recorrido, verifica-se que a prestação jurisdicional dada corresponde
àquela efetivamente objetivada pelas partes, sem vício a ser sanado. O Tribunal
de origem pronunciou-se de maneira a abordar todos os aspectos fundamentais da controvérsia,
dentro dos limites que lhe são impostos por lei.
Ademais,
como é cediço, não se caracteriza, por si só, omissão, contradição ou
obscuridade quando a decisão adota outro fundamento que não aquele defendido
pela parte.
2.
DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO
ANULATÓRIA DE REGISTRO MARCÁRIO
Depreende-se
dos autos que o registro da marca impugnada – ST SÓCIO TORCEDOR – foi concedido
à recorrente em 28/5/2002 (e-STJ fl. 178).
A
presente ação anulatória, por sua vez, foi ajuizada em 14/1/2010
(e-STJ
fl. 2).
É
sabido que a Lei de Propriedade Industrial (LPI, Lei 9.279/96), em seu art.
174, dispõe que “prescreve em 5 (cinco) anos a ação para declarar a nulidade do
registro, contados da data da sua concessão” (in verbis).
O
Tribunal a quo, todavia, a despeito
de reconhecer o decurso do prazo citado, afastou o decreto prescricional por
entender que os atos administrativos contaminados por vício de legalidade podem
ser invalidados a qualquer tempo pela Administração, em decorrência de seu
poder de autotutela.
Para
tanto, invocou a teoria dualista das nulidades – que divide os atos
administrativos defeituosos em nulos e anuláveis – e consignou que o comando
normativo do art. 54 da Lei 9.784/99 refere-se tão somente aos segundos.
Assim,
como o registro marcário impugnado teria sido concedido em desacordo com ditame
expresso da LPI (art. 124, VI), a caracterizar sua nulidade, não haveria que se
falar em prescrição.
Vale
deixar registrado o teor dos dispositivos legais precitados:
Art.
54. O direito da
Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis
para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados,
salvo comprovada má-fé.
Art.
124. Não são
registráveis como marca:
[...]
VI - sinal de caráter genérico,
necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com
o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para designar
uma característica do produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso,
valor, qualidade e época de produção ou de prestação do serviço, salvo quando
revestidos de suficiente forma distintiva;
Explicitadas
essas premissas, passa-se ao exame da insurgência.
Em
primeiro lugar, impõe-se destacar que o art. 54 da Lei 9.784/99 é regra geral
que se destina ao administrador público, tratando de conferir-lhe o direito
potestativo de anular seus próprios atos no prazo de cinco anos. Não exercido
tal direito, o ato se convalidaria pelo decurso do tempo.
Consoante
os adeptos da teoria dualista – como os julgadores que prolataram o acórdão
recorrido –, apenas os atos anuláveis estariam sujeitos a referido prazo. Os
atos nulos, por seu turno, portadores de vícios insanáveis, poderiam ser
invalidados a qualquer tempo.
Ocorre
que, no particular, não se está a discutir se a Administração pode ou não
anular o ato de registro marcário impugnado.
A
questão da nulidade, na espécie, foi trazida a juízo por pessoa jurídica de
direito privado (associação desportiva), sendo certo que o órgão responsável
pela expedição do ato impugnado sequer concorda com a posição defendida pelo
autor da demanda.
Com
efeito, o que se verifica dos autos é que, desde o início da relação
processual, o INPI tem postulado a decretação da prescrição da pretensão anulatória
e, por outro lado, quanto ao mérito, vem defendendo a higidez do registro
marcário em questão.
Nesse
contexto, afigura-se inviável, para resolução da presente controvérsia,
cogitar-se da aplicação de regras gerais conformadoras do processo administrativo
no âmbito da Administração Pública Federal (Lei 9.784/99).
Além
disso, esta Corte Superior de Justiça tem entendido que, mesmo tratando-se de
ato administrativo contaminado por nulidade, os efeitos dele decorrentes não podem
ser afastados se entre a data de sua prática e o ajuizamento da ação já houve o
transcurso do prazo prescricional previsto para incidência na correspondente
hipótese fática, salvo flagrante inconstitucionalidade. Nesse sentido, os
seguintes julgados: AgInt no AREsp 232.977/DF, 1ª Turma, DJe 31/3/2017; REsp 1.757.27/RS,
2ª Turma, DJe 21/11/2018; AgInt no REsp 1.444.111/RN, 1ª Turma, DJe 12/03/2018.
Por
outro lado, cumpre registrar que o diploma legal que trata especificamente de
questões envolvendo direito de propriedade industrial – lei especial – contém regra expressa acerca da questão
controvertida, dispondo, conforme referido linhas atrás, que a pretensão de se
obter a declaração de nulidade de registro levado a efeito pelo INPI prescreve em cinco anos, contados da
data da sua concessão (art. 174 da LPI).
Como
tal dispositivo não dá margem a interpretações distintas e dele não se extrai
qualquer diferenciação entre atos nulos e anuláveis, não cabe ao julgar fazê-lo,
sob pena de limitar indevidamente o alcance da norma. Na lição de CARLOS MAXIMILIANO,
[q]uando o texto dispõe de modo
amplo, sem limitações evidentes, é dever do intérprete aplicá-lo a todos os
casos particulares que se possam enquadrar na hipótese geral prevista explicitamente;
não tente distinguir entre as circunstâncias da questão e as outras; cumpra a
norma tal qual é, sem acrescentar condições novas, nem dispensar nenhuma das
expressas.
(Hermenêutica e aplicação do direito. 21ª ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2017, formato digital, p. 233)
Destaque-se
que a aplicabilidade desse dispositivo tem sido reiteradamente reconhecida por
esta Corte Superior, conforme se pode verificar dos seguintes precedentes: REsp
1.306.335/RJ, 4ª Turma, DJe 16/5/2017; REsp 899.839/RJ, 3ª Turma, DJe
01/10/2010; e AgRg no REsp 1.353.422/RJ, 3ª Turma, DJe 3/3/2015.
Acerca
da incidência do prazo prescricional em hipótese como a presente – em que se
discute eventual violação do art. 124, VI, da LPI – estudo doutrinário
conduzido por GIACCHETTA e LEITE elucida:
[...] nos termos do Artigo 174
da Lei da Propriedade Industrial, prescreve em 5 (cinco) anos a ação para
declarar a nulidade do registro, contados da data da sua concessão, o que,
segundo alguns autores, tornaria o registro inatacável.
E, de fato, isso ocorre com as marcas que tiveram algum vício na sua concessão, em quaisquer
das hipóteses do artigo 124 da Propriedade Industrial, e, em especial, o mencionado
inciso V I. O instituto da prescrição tem como finalidade garantir a segurança
jurídica e a estabilidade das relações sociais, fulminando qualquer pretensão
de nulidade 5 (cinco) anos após a concessão do registro.
Ora, qualquer terceiro
eventualmente prejudicado teve diversas oportunidades para opor-se ao registro,
instaurar processo administrativo de nulidade e, ainda, cinco anos para ajuizar
uma ação de nulidade.
(GIACCHETTA, André Zonaro e LEITE,
Márcio Junqueira. Ação declaratória e a relação jurídica tripartite decorrente
dos direitos de propriedade industrial, in ROCHA, Fabiano de Bem da (Organizador), Capítulos de Processo Civil na Propriedade Industrial,
Lumen Juris, 2009, p. 22)
Entender
que a ação de nulidade seria imprescritível equivaleria a esvaziar completamente
o conteúdo normativo do dispositivo invocado, fazendo letra morta da opção
legislativa.
Outro
efeito deletério advindo dessa compreensão seria a instabilidade jurídica que
acarretaria ao titular do registro e, por contaminação, a todo o sistema de
defesa da propriedade industrial.
De
fato, como bem anotado por DANNEMANN (et al.),
entender que o titular da marca esteja indefinidamente sujeito à decretação de
invalidade do registro obtido, mesmo depois de ter seguido todas as etapas do
longo período de tramitação do procedimento administrativo para sua aquisição –
acrescido dos cinco anos do prazo para ajuizamento da ação de nulidade – teria
como consequência instaurar o pânico em relações e situações jurídicas
perfeitas e acabadas, indo de encontro àquilo que o instituto da prescrição
justamente visa proteger: a segurança jurídica e a estabilidade das relações
sociais (Propriedade intelectual
no Brasil. Rio de Janeiro: PVDI Design, 2000, p. 321)
De
se registrar que não se desconhece o teor do art. 6º bis (3) da Convenção da União de Paris (promulgada no Brasil pelo
Decreto 75.572/75), segundo o qual os países signatários do Tratado se
comprometem a não fixar prazo para requerer o cancelamento ou a proibição de
uso de marcas registradas ou utilizadas de má-fé quando em conflito com sinal notoriamente
conhecido.
Todavia,
conforme reconhecido pelo juízo de origem, “no caso, não restou demonstrada,
pela autora, qualquer evidência de que a ré tenha agido de má-fé, a qual, vale
dizer, não pode ser presumida. Ressalte-se, ainda, que a circunstância da má-fé
sequer foi alegada pela parte autora” (e-STJ fl. 316).
Vale
consignar, outrossim, a existência de relevante posição doutrinária no sentido
de que nem mesmo a existência de má-fé na obtenção do registro ensejaria o
reconhecimento da imprescritibilidade da pretensão anulatória, conforme anotado
por JOSÉ ROBERTO D´AFFONSECA GUSMÃO (A
Proteção da Marca Notória no Brasil. In RDM 70, p. 79), JOSÉ CARLOS TINOCO SOARES (Marcas Notoriamente Conhecidas - Marcas de Alto Renome vs
Diluição. Rio de Janeiro: Lumen
Iuris, 2010, p. 119) e MARCELO AUGUSTO SCUDELER, de cuja lição extrai-se a
seguinte passagem:
Como se sabe, o fundamento da prescrição
é de ordem pública, visando assegurar a estabilidade social e respeitar situações
adquiridas. Por esse mesmo motivo, ações imprescritíveis não são da tradição do
direito pátrio, apenas verificadas em casos excepcionalíssimos.
Muito embora a Convenção da
União de Paris (CUP) tenha sido incorporada no ordenamento jurídico nacional através
do Decreto 75.572/75, a LPI, por sua vez,
foi omissa no que diz respeito às ações anulatórias de registros marcários chamadas
imprescritíveis, dando a entender pela sua não incorporação, especialmente por sua
falta de tradição no direito pátrio (Do
Direito das Marcas e da Propriedade Industrial. Campinas: Servanda, 2008,
p. 231).
Ademais,
de acordo com o assentado por ocasião do julgamento do REsp 1.149.403/RJ (3ª
Turma, DJe 29/11/2013), a imprescritibilidade não constitui regra no direito
brasileiro, sendo admitida somente em hipóteses excepcionalíssimas que envolvem
direitos da personalidade, estado das pessoas, bens públicos. Os demais casos
devem se sujeitar aos prazos prescricionais do Código Civil ou das leis
especiais.
Diante
de todo o exposto, a conclusão inafastável é a de que o acórdão impugnado, ao reconhecer
a imprescritibilidade da pretensão deduzida pelo recorrido, está a merecer reforma.
3.
CONCLUSÃO
Forte
em tais razões, DOU PROVIMENTO ao
recurso especial, para decretar a prescrição da pretensão anulatória deduzida
na inicial.
CERTIDÃO
DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA
Número
Registro: 2018/0173938-7 PROCESSO
ELETRÔNICO REsp 1.782.024 / RJ
Números Origem:
08009297920104025101 201051018009296
EM MESA
JULGADO: 07/05/2019
Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MOURA RIBEIRO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MÁRIO PIMENTEL ALBUQUERQUE
Secretário
Bel. WALFLAN TAVARES DE ARAUJO
AUTUAÇÃO
RECORRENTE
: RECANTO - CONSULTORIA, INFORMATICA E PROMOCOES LTDA ADVOGADOS : GIORGIA CRISTIANE
PACHECO - PR023776
EDUARDO GUSTAVO PACHECO -
PR027185
FABIO RODRIGUES
GUIMARÃES DA SILVA E OUTRO(S) - RJ126478 RECORRIDO : SAO PAULO FUTEBOL CLUBE
ADVOGADOS
: CARLOS MIGUEL CASTEX AIDAR - SP022838
ULYSSES ECCLISSATO NETO -
SP182700
RECORRIDO
: INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas
- Propriedade - Propriedade Intelectual / Industrial - Marca
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA
TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data,
proferiu a seguinte decisão:
A Terceira Turma, por unanimidade,
deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto da Sra. Ministra
Relatora.
Os Srs. Ministros Paulo de Tarso
Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro (Presidente)
votaram com a Sra. Ministra Relatora.