RECURSO ESPECIAL Nº 929.604 - SP
(2007/0020232-3) RELATOR : MINISTRO SIDNEI BENETI
RECORRENTE
: L R COMPANHIA BRASILEIRA DE PRODUTOS DE HIGIENE E TOUCADOR
ADVOGADO
: CLÁUDIO FRANÇA LOUREIRO E OUTRO(S) ADVOGADA : NAHYANA VIOTT E OUTRO(S)
RECORRIDO
: INDÚSTRIA DE COSMÉTICOS NATURAIS CALANTARI LTDA ADVOGADO : CELMO MARCIO DE ASSIS
PEREIRA E OUTRO(S)
EMENTA
DIREITO COMERCIAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL.
USO DE MARCA COM ELEMENTOS SEMELHANTES. NOMES QUE, EMBORA COMUNS, DISTINGUEM
MARCA DE PRODUTO ESPECÍFICO CONSAGRADO NO MERCADO. EXCLUSIVIDADE DE USO. PROVIMENTO.
I
-
A exclusividade da marca "Leite de Rosas" é violada pelo uso da expressão
"Desodorante Creme de Rosas", mormente em embalagem semelhante
II
-
Embora composta por palavras comuns, a marca deve ter distinção suficiente no mercado
de modo a nomear um produto específico. Marcas semelhantes em produtos da mesma
classe induzem o consumidor a erro e violam direito do titular da marca original.
III
-
Recurso Especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos,
relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os
Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar
provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a).
Os
Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Vasco Della Giustina (Desembargador convocado
do TJ/RS) e Massami Uyeda votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente,
a Sra. Ministra Nancy Andrighi.
Brasília, 22 de março de
2011(Data do Julgamento)
MINISTRO
SIDNEI BENETI
Relator
RECURSO
ESPECIAL Nº 929.604 - SP (2007/0020232-3)
RELATOR : MINISTRO SIDNEI BENETI
RECORRENTE : L R COMPANHIA BRASILEIRA DE
PRODUTOS DE HIGIENE E TOUCADOR
ADVOGADO : CLÁUDIO FRANÇA LOUREIRO E OUTRO(S)
RECORRIDO
: INDÚSTRIA DE COSMÉTICOS NATURAIS CALANTARI LTDA
ADVOGADO : CELMO MARCIO DE ASSIS PEREIRA
E OUTRO(S)
RELATÓRIO
O
EXMO. SR. MINISTRO SIDNEI BENETI:
1.-
Trata-se de Recurso Especial interposto por L R COMPANHIA BRASILEIRA DE PRODUTOS
DE HIGIENE E TOUCADOR com fundamento nas alíneas “a” e “c” do art. 105, III, da
Constituição Federal, contra INDÚSTRIA DE COSMÉTICOS NATURAIS CALANTARI LTDA.
2.-
Consta dos autos que a recorrente ajuizou contra a recorrida ação a fim de que se
fizesse cessar alegadas violação de marca e concorrência desleal, além de obter
indenização a ser apurada em liquidação.
O
Juízo de Primeiro Grau acolheu em parte a pretensão e condenou a recorrida a se
abster de produzir, estocar, divulgar e comercializar produtos semelhantes ao da
recorrente, sob pena de multa diária de R$10.000,00 (dez mil reais).
Ambas
as partes apelaram. A recorrente pediu a reforma da Sentença para que fosse reconhecido
o conflito entre as expressões “Leite de Rosas” e “Creme de Rosas”, além do direito
à indenização. A recorrida pediu a reforma para que fossem julgados improcedentes
todos os pedidos, pois os produtos por ela comercializados são muito diferentes
daqueles operados pela recorrente.
A
Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
deu parcial provimento à Apelação da recorrente, nos termos da seguinte ementa
(fl. 951):
Propriedade
industrial. Marca. Sentença condenando a ré a se abster de produzir produto com
embalagem semelhante à da autora. Permissão do uso da identificação “Creme de Rosas”.
Improcedência do pedido indenizatório. Manutenção da sentença, salvo quanto ao pedido
indenizatório. Recurso da ré não provido; provimento, em parte, do recurso da autora.
Como
visto, a Sentença foi reformada, julgando o Acórdão procedente também o pedido de
indenização formulado pela recorrente, pois, reconhecida a contrafação, “admissível
que ela tenha causado prejuízos à autora e que devem ser indenizados” (fl. 955).
Determinou-se
que o montante devido será fixado em liquidação.
3.-
Em suas razões de Recurso Especial (fls. 934/974), a recorrente se insurge contra
o fato de não ter sido acolhido o pedido de abstenção de uso, pela ré, do nome “Creme
de Rosas” em seus produtos, o qual, segundo a recorrente, gera confusão com o seu
“Leite de Rosas”.
Argumenta que “considerando que houve reconhecimento
expresso da ocorrência de contrafação nos autos, somando ao fato de a Recorrida
ter sido condenada ao pagamento de indenização pela prática de ato ilícito, a ausência
de condenação a fim de que a Recorrida fosse compelida a se abster de utilizar a
expressão “Creme de Rosas” constitui violação expressa aos artigos 124, V e XIX,
e 130, III, da Lei 9.279/96” (fl. 968).
Procura
demonstrar dissídio jurisprudencial. Aponta como paradigma Acórdão proferido pelo
Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no qual foi declarada a nulidade do registro
da marca “Creme de Rosas” por constituir violação à marca registrada “Leite de Rosas”.
4.-
A recorrida não apresentou contrarrazões (fl. 993). É o relatório.
RECURSO
ESPECIAL Nº 929.604 - SP (2007/0020232-3)
VOTO
O
EXMO. SR. MINISTRO SIDNEI BENETI(RELATOR):
5.-
A recorrente, pessoa jurídica que atua no ramo dos produtos de perfumaria,
postulou que a recorrida se abstivesse de produzir e comercializar produtos com
embalagens semelhantes, bem como de usar o nome “Creme de Rosas”, além da indenização
pelo ato ilícito já cometido.
A
Sentença foi de parcial procedência. O Juízo de Primeiro Grau entendeu que a indenização
não era cabível e, além disso, considerou que o nome “Creme de Rosas” era composto
de nomes comuns e, por isso, não dava ensejo à proteção da marca. Da sentença se
colhe o seguinte (fl. 500):
Não
é possível, todavia, obstar a ré de utilizar a denominação creme de rosas em seus
produtos. É que a palavra creme descrimina o produto que está sendo vendido,
enquanto designativo de caráter comum, de forma que a utilização por si só desse
título, não importa em imitação, desde que a ré proceda à modificação da cor da
embalagem, da cor das letras e do padrão dos caracteres.
Quanto
ao uso da expressão como nome do produto, a Sentença foi mantida pelo Acórdão recorrido,
que só a reformou em parte a fim de julgar procedente o pedido de indenização.
6.-
A controvérsia, portanto, cinge-se ao uso da expressão “Creme de Rosas”, que a
recorrente afirma ser mera variação da marca “Leite de Rosas”.
No
julgamento recorrido, a semelhança das expressões leva a crer que são meras variações
do mesmo produto. Tanto é que, em outra oportunidade, o próprio INPI, para proteger
“Leite de Rosas”, negou-se pedido de registro da marca “Água de Rosas”. Concluiu
que a utilização da expressão “Creme de Rosas” confunde o consumidor e permite a
diluição do valor patrimonial que marca original adquiriu ao longo de mais de setenta
anos de presença ininterrputa nos lares brasileiros.
7.-
Assiste razão à recorrente. Sem dúvida, tal como ponderou o Tribunal de origem,
a palavra “creme” é distinta da palavra “leite”. Todavia, deve ser considerado o
risco de que, mesmo quando apostas em embalagens diferentes, induza a erro quanto
à origem de produtos distintos inseridos na mesma classe (Classe 29 do INPI: “Aparelhos
e artigos de toalete, cosméticos e artigos para bebês”).
Leite,
creme e rosas são designativos comuns, mas a marca “Leite de Rosas” adquiriu notoriedade
e há muito se consolidou no mercado brasileiro, de modo a nomear não qualquer produto,
mas aquele específico comercializado pela recorrente.
Nesse
contexto, procede a alegação de que existe o risco de um desodorante com o nome
"Creme de Rosas" ser confundido com uma variação do conhecido "Leite
de Rosas". Várias outras marcas bem conhecidas como "Leite Moça",
"Leite Longa Vida", etc, também tem designativos comuns em sua composição,
mas é ponderável que "Leite de Rosas" e "Creme de Rosas" - ambas
apostas em embalagens de desodorante, na mesma cor rosa-forte e com dizeres igualmente
na mesma cor - parecem se referir a variantes do mesmo produto (vejam-se fls. 9
do apenso, 31/32 e 762 destes autos).
Afinal, imitar a marca: "É arremedá-la. É desfigurá-la, criando
outra que, posto seja dela diferente, mantenha com ela tal semelhança ou contenha
tantos de seus elementos característicos que facilmente se confunda uma com a
outra" (WALDEMAR FERREIRA, Direito
Comercial, 1962, v. VI, p. 599).
8.-
É certo que o direito de exclusividade ao uso da marca não deve ser exercido de
modo a impedir o uso de marca semelhante deferido para produto de classe diferente,
mas são excetuados os casos de marca notória ou de alto renome, bem como os casos
de evidente má-fé.
No
caso dos autos, a má-fé da recorrida ficou evidente, pois foi comprovado que fazia
embalagens muito semelhantes àquelas utilizadas pela ora recorrente, o que, a toda
evidência, iluda o consumidor, usufruindo do respeito que já era inerente à marca
desta última.
Ficou
provado, portanto, que houve intenção de imitar a marca da recorrente, o que, evidentemente,
configura má-fé.
Ainda
que a recorrida já tenha sido condenada a se abster de comercializar seus
produtos em embalagens que confundam o consumidor, não se pode ignorar a efetiva
confusão do consumidor, decorrente do uso da expressão muito semelhante à consagrada
no mercado.
Autorizar
o uso da marca questionada seria dar ensejo à perpetuação da prática lesiva aos
interesses do consumidor e aos da recorrente.
9.-
Diante do exposto, dá-se provimento ao Recurso Especial, a fim de se julgar procedente
o pedido de abstenção de utilização, pela recorrida, da marca "Creme de Rosas",
mantidos os ônus da sucumbência.
Ministro
SIDNEI BENETI Relator
CERTIDÃO
DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA
Número Registro:
2007/0020232-3 REsp 929.604 / SP
Números Origem: 1677534 16775340 23641997 8377449 03
PAUTA:
22/03/2011 JULGADO: 22/03/2011
Relator
Exmo. Sr. Ministro SIDNEI BENETI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MASSAMI UYEDA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. JUAREZ ESTEVAM
XAVIER TAVARES
Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO
DA ROCHA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE
: L R COMPANHIA BRASILEIRA DE PRODUTOS DE HIGIENE E TOUCADOR ADVOGADO : CLÁUDIO
FRANÇA LOUREIRO E OUTRO(S)
RECORRIDO
: INDÚSTRIA DE COSMÉTICOS NATURAIS CALANTARI LTDA ADVOGADO : CELMO MARCIO DE ASSIS
PEREIRA E OUTRO(S)
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Coisas
- Propriedade - Propriedade Intelectual / Industrial - Patente
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA
TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data,
proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, deu
provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)
Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Vasco Della Giustina (Desembargador
convocado do TJ/RS) e Massami Uyeda votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi.