ACÓRDÃO
ACORDAM, em 8a Câmara de Direito Privado do
Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão:
"NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA RECONVINDA E DERAM PARCIAL
PROVIMENTO AO DA RECONVINTE, COM DETERMINAÇÃO. V.U", de conformidade com o
voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores
CAETANO LAGRASTA (Presidente), RIBEIRO DA SILVA E LUIZ AMBRA.
Voto n. 20.690 - 8a
Câmara de Direito Privado
Apelação n. 994.09.338262-3 - São
Paulo
Apelantes: Britânia Eletrodomésticos
Ltda. e outro
Apelados: Grupo Seb do Brasil
Produtos Domésticos Ltda. e outro
Proteção de marca e patente. Ação
principal com pedido de declaração de inexistência de irregularidade.
Reconvenção com pedido de abstenção de comércio, fabrico e exposição de produto
similar e utilização da marca. Violação à proteção da marca e da patente
caracterizada. Improcedência da ação principal mantida e parcial procedência da
reconvenção com maior abrangência. Improvido o recurso da autora-reconvinda,
parcialmente provido o da requerida-reconvente, com determinação.
Vistos.
Trata-se de ação declaratória,
cumulada com pedido de antecipação da tutela, proposta por Britânia
Eletrodomésticos Ltda em face de SEB S.A e Arno S.A, na qual pleiteia a
declaração de que a exploração comercial do produto indicado na inicial não
afronta direitos das requeridas.
As
requeridas propuseram reconvenção (fls. 349 e ss.), com pedido de antecipação
da tutela, na qual pleiteia que a autora se abstenha de comercializar, fabricar
ou expor produto similar ao objeto da patente mencionada na inicial.
A
ação foi processada sem a antecipação dos efeitos da tutela (fls. 463 e ss.).
A
r. sentença de fls. 1045 e ss., cujo relatório se adota, julgou improcedente a
ação principal e parcialmente procedente a reconvenção. Assim, reconhecida a
violação do privilégio de invenção, condenou-se a autora da ação principal na
obrigação de se abster de comercializar o produto e indenizar pelos danos
materiais, rejeitando o pedido de indenização por danos morais.
Irresignadas,
apelam as partes.
Britânia Eletrodomésticos Ltda
sustenta, em síntese, ser descabida a violação da patente por equivalência, mesmo
porque não se trata de inovação, nos termos do artigo 11 da LPI. Alega a
necessidade de nova perícia. Aduz que o título da patente é nulo, nos termos do
arts. 8o e 13 da LPI. Afirma, ainda, que a LPI não protege a
finalidade, mas o meio de se resolver o problema técnico (arts. 25 e 41).
Alega, ainda, a inexistência de nexo de causalidade a justificar o pedido de
indenização, tendo em vista a ausência de violação à patente ou ato de
concorrência desleal. Pede o reconhecimento do princípio da livre concorrência
(arts. 170, IV, da CF e 20, I, da Lei n. 8884/94). Afirma que o produto que
comercializa possui tecnologia distinta daquela patenteada, as marcas
utilizadas são diferentes e há diferença visual na apresentação do produto. Por
fim, alega não haver razão para a condenação dos danos materiais nos parâmetros
utilizados, mesmo porque não demonstrados os prejuízos, nos termos dos arts.
208 e 210, da LPI.
O Grupo SEB do Brasil Produtos
Domésticos Ltda e outra sustentam, em síntese, que a perícia realizada concluiu
que houve infração à patente por equivalência. Alegam que a utilização da marca
enseja confusão no consumidor, tendo em vista a aparência das expressões
"Líssima" e "Super Liss", nos termos dos artigos 5o
, XXIX, da CF, 2o, III, da Lei n. 9279/96, e 14 do Decreto n.
2181/97. Pedem a majoração da multa arbitrada para o caso de descumprimento da
determinação de abstenção de comercialização do produto e do valor arbitrado a
título de honorários advocatícios.
Recursos recebidos e respondidos.
Distribuídos os autos, houve deferimento da antecipação da tutela (fl. 1148).
É o relatório.
Reitera-se, de início, o despacho de
fl. 1241, com o seguinte teor: Não há
prejudiciálidade, sendo que o retorno
dos autos ao Acervo é pedido esdrúxulo, diante das reiteradas acusações de
morosidade atribuída ao Poder Judiciário. O que está o peticionário a pretender
é que haja julgamento(s) de acordo com seus interesses. Observa-se, ainda, que a afirmação inserida no
despacho de fl. 1148 refere-se ao desfecho da demanda e obtenção final da
tutela, como fundamento para a antecipação dos seus efeitos e não impede o
julgamento do Acervo de processos. Acresce-se que, atento à determinação do
CNJ, tendo já cumprido as metas programadas, com o julgamento dos processos
assumidos do Acervo do Des. Álvares Lobo, inicio a apreciação de todos os
processos de 2008 e 2009; e que, a partir da unificação dos tribunais desde
abril de 2005 até junho de 2010, este Relator proferiu 9.432 votos.
Rejeita-se a tentativa de
desqualificação do perito após resultado desfavorável, matéria, inclusive,
objeto de decisão por esta C. Turma Julgadora (AI n. 694-4), mesmo por que o
trabalho apresentado trouxe esclarecimentos suficientes e didáticos para o
convencimento do magistrado e desta C. Turma Julgadora, nos termos do art. 131
do CPC.
Da análise da referida perícia,
verifica-se que se pretende a proteção referente a acessório, ou seja,
dispositivo para alisar cabelo, acoplado à saída do secador.
Destaca-se a conclusão de que tais diferenças
devem ser atribuídas ao desenvolvimento técnico do produto posteriormente à
data da prioridade da patente em questão (fls. 700/701), ou seja a atividade inventiva essencial da referida
patente é o afunilamento propiciado pelos "chanfros" das superfícies
de aperto e/ou apoio móveis (fl. 701).
Nesse sentido, pelas conclusões da
perícia, verifica-se que, apesar das alegações da autora da ação principal de
que seu desenho é diferente do utilizado pelas requeridas, houve contrafração
por equivalência, ou seja, a autora beneficia-se da característica essencial da
tecnologia objeto da proteção e que não foi considerada no estado da técnica,
ou seja, o produto da autora-reconvinda
infringe o ponto característico 1 da
reivindicação independente 1 da patente n. PI 9914639-8 de titularidade da
co-Ré-reconvinte SEB S/A, por equivalência, uma vez que as bordas arredondadas
das superfícies de aperto e/ouapoio (lâminas) realizam "substancialmente a mesma função, substancialmente da
mesma forma produzem substancialmente o mesmo resultado que o elemento expresso
na reivindicação" (fl. 715).
Sem consistência, portanto, a
alegação de ausência de infração à proteção ou nulidade da patente, não só
pelas conclusões da perícia, mas pelo fato de que esta alegação é contraria ao
princípio da boa-fé objetiva e proibição do exercício arbitrário das próprias
razões, devendo-se observar que a autora-reconvinda não apresentou medida
judicial hábil para discutir a legalidade da patente antes de iniciar a
comercialização de seu produto. Assim, não havendo contestação eficaz à
patente, deve ser considerada válida e oponível a terceiros.
A razão está, ainda, com o perito,
ao considerar que a utilização das marcas "Super Liss" e
"Líssima" pode induzir o consumidor em erro, tendo em vista se tratar
de aparelho com a mesma finalidade e a utilização do radical "LISS"
associado aos superlativos "SSÍMA" ou "SUPER". Os produtos,
destinado ao mesmo público, têm a mesma função, qual seja, secar e alisar o
cabelo ao mesmo tempo, conforme ilustram as publicidades de fls. 748 e 751.
Assim, tendo em vista a utilização de marca similar, em produto com a mesma
finalidade, para o mesmo público e em publicidade semelhante, evidente que
caracterizada a infração à proteção da marca, em prejuízo, não só das
requeridas-reconvintes, mas dos consumidores e da sociedade em geral.
Correta a r. sentença, portanto,
tendo em vista a necessidade de proteção do direito da propriedade industrial,
nos termos dos artigos 5o , XXIX, da CF, art. 11 e ss. do CC, 6o,
8o, 41, 122, 130, III da LPI, devendo-se, contudo, estender o
reconhecimento da violação da propriedade da marca, conforme acima explicitado.
A indenização fixada na r. sentença,
nos termos dos artigos 208 e 210, II, da LPI, porque não impugnada com
critérios suficientes para afastar a razoabilidade e correção do critério nela
adotado, deve ser mantida, tendo em vista a necessidade de ressarcimento dos
prejuízos da requerida-reconvinte, evitando-se o enriquecimento sem causa.
Ressalta-se a rejeição do pedido de danos morais, que não foi objeto de
devolução nos apelos.
Assim, tendo em vista o
reconhecimento da violação dos direitos decorrentes da patente e da marca, de
rigor a manutenção da autora-reconvinda na abstenção da fabricação,
comercialização ou exposição do produto identificado na inicial, ou outro que
utilize a mesma tecnologia e utilização da marca "Super Liss", não
havendo razão para o aumento da multa arbitrada, mesmo porque pode ser objeto
de análise, conforme a conduta da autora no cumprimento da sentença, mantido,
ainda, o critério para a aferição do valor da indenização por danos materiais.
Por fim, mantém-se o valor arbitrado
a título de honorários, eis que baseado no valor da condenação, restando
suficiente para a remuneração digna da profissão e nos parâmetros do art. 20 e
seus parágrafos do CPC.
Afasta-se, por fim, tendo em vista a
argumentação acima desenvolvida a violação, no julgamento, aos arts. 170, IV,
da CF; 20, I, da Lei n. 8884/94; 8o, 11, 13, 25, 41, 208 e 210 da LPI.
Ante o exposto, NEGA-SE PROVIMENTO
ao recurso da autora-reconvinda e DÁ-SE PARCIAL PROVIMENTO ao das
requeridas-reconvintes, determinando-se a comunicação imediata deste julgamento
ao e. Relator do Mandado de Segurança n. 990.10.048987-9, e ao Des. Salles
Rossi, que está com pedido de "vista".
CAETANO LAGRASTA
Relator